Ética sexual cristã e ideologia de gênero: produtos de suas respectivas cosmovisões

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20035

 Introdução

A ética sexual bíblica é elevadíssima. Ela diz que Deus criou homem e mulher, macho e fêmea os criou, e que eles deveriam se unir em uma só carne em imaculado matrimônio a fim de se multiplicarem e darem efetividade ao cumprimento de seu mandato cultural. Desse modo, para o cristão, as funções de cada sexo estão definidas biológica, social e espiritualmente. É algo, portanto, imutável. O famoso jargão popular “homem é homem, e mulher é mulher” define muito bem tal pensamento. Faz parte de sua mentalidade antitética.

Ocorre que a sociedade pós-cristã há muito já não segue esse entendimento. Há uma aceitação crescente de uma percepção secular humanista, da qual a ideologia de gênero é mais um desdobramento.  Para essa ideologia não vale o dito popular acima citado, mas prevalece uma leitura dialética da realidade e, por conseguinte, da essência do ser humano, em que sínteses entre dois opostos são aceitas para determinar a existência, a vida e, até mesmo, a sexualidade, que, por sua vez, nada mais seria do que uma possibilidade no rastro da evolução natural da espécie humana dentro de um contexto em que também a construção social detém atribuição determinante.

A compreensão das cosmovisões terá um papel importante neste artigo.[1] A maneira que uma pessoa vê o mundo e nele age de acordo com que o interpreta são as lentes com as quais as pessoas absorvem e filtram a realidade. Tanto a ética sexual cristã como a ideologia de gênero se apresentam como desdobramentos conclusivos de suas cosmovisões, e, portanto, são óculos através dos quais compreendem essa área específica da natureza e das relações humanas.

É importante, ainda, destacar que uma visão de mundo se organiza numa unidade coerente de sentido, que dá forma àquilo que cada um acredita sobre o cosmos – o mundo organizado. O estudo das cosmovisões nos revela que as crenças e disposições básicas não atuam de forma separada, mas dentro de uma dinâmica interligada e sistemática. Cada cosmovisão se mostra como um sistema de pensamento completo. Por isso, os pressupostos metafísicos, ontológicos, epistemológicos e éticos se conectam de forma indissociável. De igual modo, as narrativas exercem forte influência sobre a percepção de mundo do indivíduo, que podem, na prática, até contrariar os pressupostos racionalmente declarados, revelando suas crenças mais enraizadas em seus comportamentos.

Destarte, o objeto deste estudo é uma análise comparativa entre a ética sexual cristã e a ideologia de gênero a partir da integralidade das respectivas cosmovisões que as ordenam.

  1. Ética cristã: produto de uma cosmovisão coerente

Francis Schaeffer afirmou que “o cristianismo é a verdade sobre todo o universo[2]. Esse é um resumo que representa o pensamento cristão sobre sua maneira de enxergar a vida e a realidade, tendo o evangelho como verdade absoluta sobre toda a existência. Tal afirmação é possível porque o cristianismo também é um sistema completo de crenças e pressupostos, racional e perfeitamente coerente, que faz sentido como explicação do todo.

A fé cristã tem a Bíblia como seu documento epistemológico. As Escrituras Sagradas, ainda que constituídas por 66 livros escritos em um período de aproximadamente 1500 anos e por vários autores, apresenta uma metanarrativa que lhe confere unidade. Uma metanarrativa é a narrativa maior que liga e dá consistência a todas as outras nela contida.  O drama bíblico se inicia em Gênesis, no Jardim do Éden, e desenvolve-se no plano de redenção, tendo seu desfecho na Nova Jerusalém, o jardim restaurado em Apocalipse. Desse modo, criação, queda, redenção e consumação formam a base para aquilo que o cristão crê sobre Deus, sobre o ser humano, sua origem, seu fim, sobre como deve viver, sobre a fonte de conhecimento que lhe assegura a veracidade de todas essas coisas (as próprias Escrituras), e enfim, fundamentam sua compreensão sobre a realidade. Não por menos, Herman Dooyeweerd declara que “o motivo bíblico da religião cristã – criação, queda e redenção por meio de Cristo Jesus – opera por meio do Espírito de Deus como força motriz na raiz religiosa da vida temporal”.[3]

Ora, no arranjo de uma cosmovisão, os pressupostos são interligados de maneira tal que cada um deles afeta os demais. Destarte, sempre que uma pessoa muda sua ideia ou percepção sobre um campo específico de seu pensamento, todo o resto fica suscetível a sofrer algum tipo de alteração. Suas aplicações são resultados conclusivos do sistema de crenças, e nunca o oposto. Pois bem, sendo a Bíblia o fundamento epistemológico do pensamento cristão, não é por acaso que o primeiro livro nela contido, o livro de Gênesis (“Início” ou “Origens”) lança as bases metafísicas de sua visão de mundo e lhe confere sua sustentação ontológica, teleológica e ética, inclusive, para o fim que aqui nos importa, da moralidade sexual.  O cristianismo, como qualquer sistema racional, é um castelo de baralho, no qual uma carta que seja removida provoca o colapso de toda a construção. A carta na base do castelo cristão é a narrativa da criação encontrada em Gênesis.

Em vista disso, se a Bíblia é confiável como fonte de conhecimento e nos afirma que este mundo teve um início temporal e foi criado por um ser que está além do espaço-tempo, que tem poder para dar sustento e continuidade a tudo o que existe, então nenhuma narrativa descrita nas Escrituras pode carecer de coerência, e nada do que o Criador requer de suas criaturas é despropositado. A bem da verdade, a primeira sentença da Bíblia, encontrada em Gênesis 1.1, “No princípio, criou Deus os céus e a terra”[4],  torna possível, exequível e exigível todo o resto. Um Deus que tudo criou pode fazer o que quiser e como quiser, mesmo que pareça absurdo e sem explicação aos olhos da ciência ou das tradições humanas. Aliás, a ciência é limitada ao que pode observar e testar empiricamente no âmbito dos fenômenos naturais, e muitos acontecimentos descritos na Bíblia estão fora do alcance de sua análise. A criação ex-nihilo foi um evento único, que o homem pode buscar entender, mas que deve, porém, aceitá-lo como fato histórico e sobrenatural, antes de ser científico. A propósito, render-se aos limites humanos é sabedoria, como concluiu o pregador no Livro de Eclesiastes (8.17): “então, contemplei toda a obra de Deus e vi que o homem não pode compreender a obra que se faz debaixo do sol; por mais que trabalhe o homem para a descobrir, não a entenderá; e, ainda que diga o sábio que a virá a conhecer, nem por isso a poderá achar”. E é importante salientar que tudo que o Criador escolheu revelar tem o propósito de obediência à sua lei, conforme exortado em Deuteronômio (29:29): “As coisas encobertas pertencem ao Senhor, nosso Deus, porém as reveladas nos pertencem, a nós e a nossos filhos, para sempre, para que cumpramos todas as palavras desta lei”. Desse modo, a epistemologia bíblica é autoritativa e por revelação, carregando, intrinsecamente, um propósito ético em si.

Destarte, ao compreendermos o ser humano como tendo sido criado por um Deus que atribuiu propósito, objetivo e finalidade à sua criação, é possível perceber em sua revelação variadas instruções para suas criaturas. Diz o salmista, “Vivifica-me, segundo a tua misericórdia, e guardarei os testemunhos oriundos de tua boca”. – Salmo 119:88.  Por isso, uma analogia um tanto quanto simplória, mas que cumpre papel didático importante neste estudo seria comparar a Bíblia a um manual do fabricante. O manual de um produto industrializado nos ajuda a ter uma visão completa sobre ele, e ignorá-lo certamente não é uma boa ideia. A explicação do fabricante sobre o material que a mercadoria é feita, sobre como é montada e como deve ser utilizada, nos ajuda a entender para que ela serve, como funciona e como deve ser cuidada. Certamente, um manual de instruções não é uma cosmovisão, mas temos aí categorizados os seus elementos: uma fonte de conhecimento considerada confiável acerca da mercadoria, uma exposição sobre a origem e a natureza do produto, e, finalmente, sobre como utilizá-lo para melhor atingir o seu fim. Toda informação que ali consta é de fundamental importância para o seu uso adequado, para prolongar e dar qualidade à sua vida útil. Por mais simplista que seja a analogia, com o ser humano é a mesma coisa! As informações as quais dermos credibilidade acerca de como, do que e para que fomos feitos alteram, invariavelmente, o que acreditamos sobre quem somos, o nosso propósito e, não menos importante, tem consequências inevitáveis sobre as nossas concepções éticas. Para a fé cristã, é a Bíblia que nos informa todas essas coisas.

Jesus demonstra o peso ético das Escrituras ao extrair da historicidade do relato da criação em Gênesis uma aplicação moral acerca do casamento e do divórcio:

Não tendes lido que o Criador, desde o princípio, os fez homem e mulher e que disse: Por esta causa deixará o homem pai e mãe e se unirá a sua mulher, tornando-se os dois uma só carne? De modo que já não são mais dois, porém uma só carne. Portanto, o que Deus ajuntou não o separe o homem. (Mateus 19.4-6).

Para Cristo, a narrativa criacional tem relação direta na instituição e manutenção do casamento. Da mesma maneira que Paulo traz as bases de sua doutrina da redenção na historicidade de Adão (Romanos 5.12-21 e I Coríntios 15.20-22 e 45), Jesus aqui o faz em relação ao que ensina quando perguntado sobre divórcio. Ou seja, o questionamento ético dos fariseus é respondido com uma referência metafísica e ontológica. Contudo, esta passagem não somente apresenta os fundamentos de uma determinada moralidade acerca do matrimônio em si, mas é chave para compreendermos a ética sexual do cristão de maneira integral.

Perguntas tais sobre “como sabemos algo?” e “como podemos saber que sabemos?” são respondidas pelo campo da epistemologia. Quando Jesus introduz sua resposta aos seus inquisidores “não tendes lido?”, ele apresenta a base epistemológica da ética cristã, isto é, vocês podem saber a veracidade do que vou lhes dizer sobre a ética do matrimônio porque são conclusões que partem da Torá. Ao falar sobre “o Criador”, e “desde o princípio”, Cristo ensina que a realidade integral não é apenas física, mas é metafísica, ou seja, sua integralidade vai além daquilo que pode ser observado neste mundo e no universo, pois há mais do que matéria, tempo e energia em nossa existência. Este universo teve um princípio, e antes dele, já havia um Criador que deu o impulso inicial a tudo o que foi criado, tendo, assim, direito de governo sobre a criação. Desse modo, a ontologia de Deus também é destacada, seguida de uma explicação da ontologia humana, mais especificamente, acerca da sua natureza sexual: “Os fez homem e mulher, macho e fêmea”. Para a visão de mundo cristã, não há um terceiro sexo (ou diversos) além de homem e mulher, que foram feitos como macho e fêmea. Sendo assim, a forma correta de eles se relacionarem intimamente é através do casamento. Ao afirmar “E ordenou”, Jesus nada mais fez do que entregar uma conclusão ética coerente com a metafísica, ontologia e epistemologia apresentadas em sua reposta: “Por isso o homem deixará pai e mãe e se unirá à sua mulher; e serão os dois uma só carne… Assim, não são mais dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus uniu o homem não separe”.

Temos aí, dos lábios do próprio Cristo, uma clara demonstração de como cada área de uma visão de mundo gera consequências no campo moral. De igual modo, temos um resumo perfeito da ética sexual cristã a partir de cada elemento de sua cosmovisão. Homem e mulher devem cumprir seu papel familiar e social a partir do que é biologicamente e espiritualmente definido pelo Criador e conforme revelado nas Escrituras.

A respeito da importância do relato da criação em Gênesis e as inevitáveis implicações epistemológicas de sua relativização, J.P. Moreland, professor de Filosofia na Universidade de Biola, escreveu um dos artigos do livro multiautoral “Theistic Evolution – A Scientific, Philosophical, and Theological Critique”. O título de seu texto é autoelucidativo: “How Theistic Evolution Kicks Christianity Out of the Plausibility Structure and Robs Christians of Confidence that the Bible is a Source of Knowledge”. No resumo, ele diz:

Nós podemos ter conhecimento (isto é, crença verdadeira justificada) de uma grande gama de coisas: lógica, matemática, a verdade do cristianismo, várias doutrinas bíblicas, verdades éticas, e assim por diante. Ainda que importante, a ciência é apenas uma das maneiras que os humanos sabem as coisas. Contudo, devido ao cientificismo largamente difundido – a visão que as ciências duras são a única ou a maneira vastamente superior de saber as coisas, especialmente em comparação à teologia e ética – na nossa cultura, evolucionistas teístas reforçam esta visão ao revisar constantemente os ensinos bíblicos e interpretações por causa do que a ciência diz. Assim, ao adotar esta perspectiva epistemológica não-bíblica, evolucionistas teístas enfraquecem a autoridade racional do ensino bíblico entre cristãos e não-cristãos. Como resultado, a Bíblia não é mais considerada por muitos como uma fonte genuína do saber, e menos e menos pessoas levam a Bíblia a sério. Dessa maneira, talvez não intencionalmente, aqueles que adotaram a evolução teísta, marginalizam as reivindicações da verdade cristã na igreja e na praça pública.[5]

A crítica do autor é focada no cientificismo que ergue “as ciências duras”, ou ciências naturais, como uma fonte superior do saber, diminuindo a importância da teologia e da ética. Para ele, essa epistemologia gera o enfraquecimento da autoridade racional dos ensinos bíblicos, levando ao seu descrédito público. O autor continua explicando em seu artigo que “o naturalismo científico tem a visão de que o cosmos físico estudado pela ciência é tudo que existe”. Ao falar da posição arrogante de um PhD em Física de que “Se você pode medir e testar cientificamente, então você pode saber[6], Moreland chama a atenção para o fato de que a reivindicação daquele homem é autorrefutável, desde que a reivindicação em si não pode ser quantificada e testada em laboratório. E ao fim do seu texto, ele confirma o que estamos analisando neste estudo, que “devemos chegar à conclusão de que a posição revisionista do evolucionismo teísta tem feito muito mais fácil revisar outros ensinos bíblicos quando há pressão cultural sobre nós para assim fazer”.[7]

Ao longo deste estudo, tais ideias serão mais exploradas. Coube neste item, porém, firmar o enunciado acerca da importância do relato da criação como pilar da cosmovisão cristã, bem como, por conseguinte, fazer sua ligação essencial com a ética sexual bíblica. 

  1. Antítese e ética sexual cristã

A partir daqui, podemos pensar em outra questão fundamental da cosmovisão cristã que apresenta reflexos na ética sexual. Observa-se em todas as Escrituras a reprodução de uma mentalidade antitética na maneira em que a realidade, a existência e a história são apresentadas, narradas e interpretadas. Tal método de pensamento confere à visão de mundo judaico-cristã uma distinta particularidade: a possibilidade de se trabalhar a partir de uma verdade única e eterna, pura, sem mistura e imutável, que sustenta todas as outras que lhe são derivadas e que seguem o mesmo modelo.

A característica da antitética é a oposição inconciliável de duas teses. Por sua vez, a dialética é o exercício de gerar síntese entre dois ou mais objetos. Dooyeweerd ensina que “considerada em si, a palavra antítese não significa mais que ‘oposição’”.[8] Se a síntese é o germe de teses opostas que formam uma nova tese conjunta, a antítese é o antagônico, o contrário, que não aceita a possibilidade de síntese com aquilo que lhe é oposto.  No pensamento cristão, as verdades e os pressupostos fundamentais são inegociáveis, e não estão em progresso de síntese ou em evolução. Veja como a metanarrativa bíblica apresenta um aspecto de continuidade linear e repetitiva, bem expressa mais uma vez em Eclesiastes (1:4-9): “Geração vai e geração vem; mas a terra permanece para sempre. Levanta-se o sol, e põe-se o sol, e volta ao seu lugar, onde nasce de novo… O que foi é o que há de ser; e o que se fez, isso se tornará a fazer; nada há, pois, novo debaixo do sol”.

Não pode haver melhor maneira de analisar a antítese cristã do que partindo de sua própria Divindade. Quando Moisés perguntou quem ele deveria dizer que o enviou, a resposta do Senhor foi: “EU SOU O QUE SOU” (Êxodo 3.14).  Não há síntese em Deus. Nem mesmo pode haver, pois nada há que possa sequer ser apresentado como antítese para si. Apesar de vivo, infinito e dinâmico, ELE É O QUE É. Imutabilidade é um de seus atributos. Sobre a segunda pessoa de Trindade, Hebreus (13.8) diz: “Jesus Cristo, ontem e hoje, é o mesmo e o será para sempre”. Tiago (1.17), por sua vez, escreveu: “Toda boa dádiva e todo dom perfeito são lá do alto, descendo do Pai das luzes, em quem não pode existir variação ou sombra de mudança.”. E em Malaquias (3.6) ouvimos da parte do próprio Deus: “Pois eu, o Senhor, não mudo”.

Pode-se perceber também um modus operandi antitético no ato da criação quando Gênesis diz que Deus criou “cada animal segundo a sua espécie”. A Bíblia não declara a origem dos vários tipos de seres vivos como resultado de um exercício dialético entre seres orgânicos e a natureza, em um contínuo processo de adaptação e comportamenteo gerador de novas espécies. Na narrativa bíblica, não foi da síntese entre seres pré-existentes e o meio-ambiente que novas espécies surgiram. Gênesis afirma que cada ser foi criado conforme a sua espécie.[9] O homem, por sua vez, do barro foi feito, tendo o espírito de vida soprado em suas narinas, e sua auxiliadora, a mulher, tendo sido criada de sua  costela. A criação e as criaturas são, assim, formadas prontas, e a obra criacional é conclusa. Não há na Bíblia a ideia de uma obra contínua que se estende em constante mutação, pois “havendo Deus terminado no dia sétimo a sua obra, que fizera, descansou nesse dia de toda a sua obra que tinha feito”. O homem criado à imagem e semelhança de Deus também apresenta uma natureza antitética em sua ontologia, sendo criado pronto, único, distinto, finalizado e separado em sua natureza do restante da criação, e não uma síntese de outros animais. E isso, para os fins de nossos estudos neste artigo, como vemos, carrega consequências.

Herman Dooyeweerd comenta que “a antítese está em todos os aspectos da própria vida cristã”.[10] Isso é visto claramente no sermão do monte, por exemplo, no qual Jesus ensina: “Seja, porém, a tua palavra: Sim, sim; não, não. O que disto passar vem do maligno” (Mateus 5.37). A ética cristã antitética do “sim, sim; não, não” é mais um reflexo da mentalidade encontrada na Bíblia.  Na teologia paulina, para citar mais um exemplo, a antítese também é sempre presente em conceitos opostos e inconciliáveis: lei versus graça, carne versus espírito, velho versus novo, pecado versus santidade, vida versus morte, etc.

Francis Schaeffer, em Como Viveremos – o surgimento e o declínio do pensamento e cultura do ocidente, descreve as consequências da mentalidade dialética sobre a concepção da verdade:

Ao invés de antíteses (que algumas coisas são verdades e seus opostos inverdades), verdade e retidão moral serão encontradas, no curso da história, uma síntese delas. Este conceito venceu não apenas no outro lado da cortina de ferro; venceu neste lado também. Hoje não somente em filosofia, mas na política, no governo e na moralidade individual, nossa geração vê soluções em termos de sínteses e não de absolutos. Quando isso acontece, a verdade, como as pessoas sempre pensaram a verdade, já morreu.[11]

Importante salientar que a dialética teórica não é a problemática tratada aqui, porém é sim aquilo para o qual Herman Dooyeweerd chama a atenção, de que “na raiz da supervalorização da dialética teórica subjaz uma dialética religiosa que está escondida daquele que pensa”[12]: A questão central está nas consequências de se admitir a dialética como realidade última para explicação de toda existência. O Deus Criador encontrado na Bíblia não é síntese de duas ideias, seres ou objetos. Ele é o Ser necessário e imutável. E a maneira em que ele opera e o que ele criou seguem o mesmo padrão do seu Ser. Dooyeweerd explica mais este assunto:

A dialética teórica ocupa-se de opostos relativos. Pelo fato de esses opostos estarem ligados a uma unidade mais elevada, eles resistem a qualquer tentativa por parte do pensamento teórico de torná-los absolutos. Assim, por exemplo a proposição de que o movimento e o repouso se excluem mutuamente de modo absoluto não faz sentido; não é difícil determinar que o movimento e o repouso simplesmente tornam visível uma mesma realidade temporal de dois modos diferentes. Em vez de excluírem-se, pressupõem-se mutuamente. A mútua dependência entre eles aponta para um terceiro elemento no qual os dois estão unidos, mesmo sendo eles conceitualmente e mutuamente excludentes. [13]

[..]

A dialética religiosa, por ser religiosa, não consegue repousar numa relação de mera correlatividade. O resultado é que ela impulsiona o pensamento e a prática da vida de um lado para o outro.

Em outras palavras, a dialética religiosa emaranha a vida e a teoria numa dialética que é totalmente incompreensível quando medida com a régua da dialética teórica. Diferentemente da dialética teórica, a dialética religiosa carece de base para uma síntese real.

Nessa busca, ela procura abrigo num dos princípios antitéticos dentro do motivo básico, dando a ele prioridade religiosa. Ao mesmo tempo, acaba por rebaixar e desprezar o princípio oposto. Mas a ambiguidade e a fragmentação do motivo básico não dão acesso a uma conciliação numa unidade verdadeira mais elevada. A conciliação torna-se impossível por causa do próprio motivo básico. Por fim, será necessário fazer uma escolha.[14]

De fato, na síntese religiosa, um dos opostos acaba sendo elevado e o outro rejeitado, exatamente como explica o autor.  Jesus ensinou que “Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de aborrecer-se de um e amar ao outro, ou se devotará a um e desprezará ao outro” –  (Mateus 6.24).  Note que nos tempos de Cristo, a concepção de religião de Roma era de que cada região do império poderia continuar adorando seus deuses, mas se alguém negasse o senhorio de César, era morto, tornando-se impossível sua conciliação integral. Isso se dá por causa do próprio motivo básico – no caso do Império Romano, o poder político totalitário. No humanismo secular da pós-modernidade, a ética e a moral devem render-se à razão humana e ao postulado de que não há verdade absoluta – ainda que essa afirmação seja em si uma tentativa de se impor uma verdade. Esses dois casos descritos são exemplos reais do que Dooyeweerd alerta, conforme citação acima, de que “a dialética religiosa carece de base para uma síntese real”,  que ela “procura abrigo num dos princípios antitéticos do motivo básico”, que “ao mesmo tempo, acaba por rebaixar e desprezar o princípio oposto”, que “a conciliação torna-se impossível por causa do próprio motivo básico” e que, “por fim, será necessário fazer uma escolha”.  Na questão sexual, objeto deste artigo, a relativização do sexo e sua desconexão com a natureza biológica proposta pela ideologia de gênero exigem a rejeição integral do que a Bíblia apresenta acerca da sexualidade humana e de todo pensamento que lhe dá a base ética.

  1. O humanismo secular e a Ideologia de Gênero

A Bíblia foi o documento de constituição da cultura ocidental cristã, a qual erigiu o Deus da Bíblia ao centro da existência. As Escrituras ditaram por dois milênios as definições do bom e do mau, da justiça e da esperança, do certo e do errado. Elas ensinaram a pensar de um determinado modo. Enquanto não se questionava sua autoridade, as pessoas absorviam sua narrativa, seus princípios morais, sua ética. A Bíblia era, enfim, a fonte inquestionável de conhecimento da verdade, o documento epistemológico da cristandade.

No momento em que a autoridade das Escrituras foi deposta pelo racionalismo iluminista, uma verdadeira revolução se sucedeu no campo da epistemologia, e a cosmovisão geral deste lado do globo sofreu significativas alterações. O cristianismo, gradualmente, foi sendo substituído pelo humanismo secular. O ser humano, até então percebido como uma criatura à imagem e semelhança de Deus, munido de propósitos pré-definidos, foi o deixando de ser. As concepções ontológicas outrora aceitas já não faziam mais sentido.  De fato, não poderia ser diferente. O homem agora instável e maleável por natureza, ao olhar para dentro de si e da própria razão como fonte do conhecimento, torna-se em uma imagem líquida (utilizando-se da linguagem de Zygmunt Bauman), com propósitos líquidos, subsistindo em uma sociedade líquida. Não menos importante, o abandono da fé cristã em sua integralidade teve desdobramentos éticos, e no campo da afetividade produziu uma sexualidade líquida. Não é à toa que o gênero fluído é mais uma das possíveis identidades sexuais entre as tantas encontradas na ideologia de gênero[15].

Em The Universe Next door, James W. Sire faz uma reflexão sobre as cosmovisões básicas que determinam o modo pelo qual pensamos – tais como deísmo, naturalismo, niilismo, existencialismo e pós-modernismo, e traça um panorama histórico de como elas se desenvolveram desde o declínio da visão teísta até o advento da pós-modernidade. O autor demonstra que o naturalismo, a visão de que toda a lei e toda a força operando no universo é natural (ou seja,  todos os fenômenos da realidade devem ser explicados a partir de leis naturais e físicas), tem fornecido a crença básica que suporta visões alternativas à explicação cristã da realidade nos motivos básicos de criação,  queda, redenção e consumação, bem como “concede a moldura para a maioria do estudos científicos”.[16]

O humanismo secular é hoje o sistema de pensamento dominante no Ocidente, que começou a ser forjado no declínio da cristandade, sendo uma síntese das ideias que excluíram o motivo cristão do centro da cultura a partir da Renascença, e que também depende de se apoiar no naturalismo filosófico. Segundo John Frame, humanismo é “uma tendência cultural enfatizando a preocupação e a natureza humana. Prominente no período da Renascença. Humanismo tornou-se altamente secularizado no período moderno tardio”[17].  Ocorre que ao propor uma visão integral do homem, os pressupostos e valores do humanismo também dependem de fundamentos que sustentem suas aplicações éticas, derivados justamente das respostas para as perguntas fundamentais acerca da existência e do significado da vida: de onde viemos, para onde vamos, qual o propósito do ser humano, como devemos viver, etc. É seguro dizer que o que ocorreu na sociedade pós-cristã não foi o abandono da religião, mas sim a troca dela. Nem mesmo o humanista ateu é capaz de refutar a dimensão religiosa de sua visão de mundo, haja vista que, na prática, esta também apresenta uma metanarrativa peculiar e pressupostos que não podem ser observados empiricamente. Tim Keller, autor e pastor presbiteriano, em sua aclamada obra The Reason for God, escreveu:

O que, então, é religião? É um grupo de crenças que explica a vida, quem nós somos, e as coisas mais importantes nas quais os seres humanos deveriam investir seu tempo. Por exemplo, algumas pessoas pensam que este mundo material é tudo que existe, que nós estamos aqui por acidente e que quando morremos nós simplesmente apodrecemos, e portanto a coisa mais importante é escolher fazer o que te faz feliz e não deixar que os outros imponham suas crenças sobre ti. Note que, ainda que isso não seja explicito, contém uma narrativa mestre, um conto sobre o significado de vida junto com a recomendação de como se viver baseado nessa narrativa das coisas.[18]

E Robert L. Thoburn diz:

O humanismo secular se tornou a nova religião estabelecida nos Estados Unidos, e as escolas públicas se tornaram a igreja estabelecida. Os impostos são usados para sustentar essa igreja estabelecida. Os professores se tornaram os sacerdotes e sacerdotisas dessa nova igreja. Até mesmo a beca preta, associada a sacerdotes e juízes, têm sido apropriada pelas escolas para simbolizar suas reivindicações, embora vistam apenas no dia da graduação ou em ocasiões especiais.[19]

Bem destaca James Sire ao citar a Parábola do Homem Louco de Nietzche, “leva um longo tempo para as ideias afundarem na cultura”. Ainda que tenha demorado, o humanismo claramente dá os seus frutos agora no século XXI. No contexto dessa nova cosmovisão a ideologia de gênero pôde ser concebida, amadurecer e florescer. Ela jamais criaria raízes na cultura da cristandade, mas encontrou solo fértil na era do humanismo secular. E por que se afirma isso?

Sire considera a metafísica (ou ontologia) “a fundação de todas cosmovisões”. Afirma ele: “Ser é anterior ao saber. Se não há nada, então nada pode ser sabido”. Ele continua dizendo: “O teísmo coloca o ser antes do saber. O naturalismo Iluminista coloca o saber antes do ser”. Essa é ordem dos fatores do Iluminismo,  exposta pelo método de Descartes, “penso, logo existo”, que transforma o homem em “uma coisa que pensa”. O autor, então, aponta para o que ele diz ser “a essência do moderno: a autonomia da razão humana”. E a partir disso, escreve:

A noção de autonomia da razão humana liberou a mente humana da autoridade dos antigos. Progresso científico e intelectual não vinha das noções reveladas nas Escrituras, mas da presunção que a razão humana poderia, de fato, encontrar seu caminho em direção à verdade. Tal conhecimento era poder, poder instrumental, poder sobre a natureza, poder para conseguir o que queremos. Na ciência, os resultados foram estrelares. Na filosofia, entretanto, o movimento de ser para saber, da primazia de Deus que cria e revela para a primazia do indivíduo que sabe por si só, foi fatal.[20]

Esse é o motivo por que ao tratar da cosmovisão cristã destacou-se anteriormente a narrativa criacional como seu pilar. Há uma lógica a ser seguida aqui. Para o cristianismo, é a sua base metafísica e ontológica que determina a sua epistemologia, que, por sua vez, revela seus pressupostos éticos, inclusive referente à sexualidade. Na visão de mundo judaico-cristã, você crê numa fonte de conhecimento porque crê em quem a revelou: “No princípio criou Deus os céus e a terra”, diz a primeira frase da Bíblia. É esse enunciado que sustenta a metanarrativa, e esta deve ser coerente com sua primeira afirmação (como de fato o é), proporcionando validade a todo resto do livro. Ao se apresentar para Moisés como o “Eu Sou”, Deus, ao mesmo tempo que confirma Gênesis 1.1, confere legitimidade à revelação que entrega ao profeta. Uma cadeia de confirmações das Escrituras ocorre a partir dos textos mosaicos, cujo primeiro princípio hermenêutico é que as escrituras interpretam as escrituras.  Igualmente, do modo que o Criador em sua essência se apresenta (como espírito, infinito, pessoal e pré-existente) para dar autoridade ao que revela, é também pelo modo que a criatura é introduzida aos cosmos criado que podemos ter confiabilidade no que se requer dela.

Ora, por isso não há espaço para a ideologia de gênero na ética sexual extraída dos dois primeiros capítulos da Bíblia. Primeiro, porque sua ética advém de seus pressupostos metafísicos. Segundo, porque a narrativa bíblica é muito rígida no quesito ontologia humana para permitir o que a referida ideologia pretende. Sobre os papéis distintos, definidos e permanentes dos dois sexos na teologia de Gênesis, já tratamos nos itens anteriores. Então, resta claro que para os proponentes da relativização dos sexos faz-se necessário um enfraquecimento dessa narrativa metafísica a fim de proporcionar uma ontologia do homem que autorize as suas ideias.

Ora, se o ser vem antes do saber, o enfraquecimento da narrativa de Gênesis traz consigo inevitáveis problemas epistemológicos, que irão servir muito bem à nova religião humanista que deseja ter a autonomia da razão, e da qual depende, por sua vez, a ideologia de gênero. Por conseguinte, aproveitam-se os defensores da diversidade sexual da maleabilidade do saber humano, a fim de serem livres intelectualmente para construir e difundir suas teses sem as amarras ontológicas de uma interpretação histórico-literal da criação na Bíblia. É verdade que por conta da influência bíblica na cultura do Ocidente pelo período milenar da cristandade, as Escrituras não podem ser ignoradas, nem mesmo na sociedade pós-cristã. Logo, a opção se dá por uma interpretação metafórica ou simbólica do livro que revela a origem da humanidade. Pois, se suas afirmações, por mais categóricas e absolutas que sejam, podem ser compreendidas através de uma leitura simbólica, esvazia-se o significado e as aplicações pretendidos pelo autor original. Ninguém lê a bula de um remédio como metáfora. Se o fizer, corre o risco de não ver surtir o efeito de cura esperado, vez que poderá administrar dose menor que o necessário, ou, até mesmo, provocar um óbito por overdose. Aliás, se numa bula medicinal você lesse uma instrução hermenêutica do tipo: “As instruções aqui contidas são metafóricas, e não devem ser interpretadas de forma literal”, você não daria o mesmo nível de atenção nem para o que está ali escrito e nem mesmo para o remédio que ela pretende prescrever. Essa é uma ilustração pequena de um conflito epistemológico que surge quando se muda um método interpretativo de um livro. Ainda que na Bíblia exista todo tipo de gênero de literatura, cada livro nela contido deve ser lido dentro de seu estilo literário. Assim, por que, então, dar-se-ia valor empírico a um livro histórico do qual não podemos saber se está lidando com fatos reais? Ora, nada mais conveniente para quem não quer se submeter à ética bíblica e busca ter a própria razão como árbitro do que deve ser levado em conta no texto. Prato cheio para um ambiente intelectual propício à ideologia de gênero, que simplesmente não pode se debruçar em Adão e Eva históricos.

Natammy Bonissoni, em sua tese de doutorado “A inviabilidade de subsistência de um ambiente multicultural Laico”, assim escreveu:

Ao negar uma moralidade fundamentada na ordenança divina, o homem é entregue a axiomas imanentes e se vê obrigado a sustentar normas objetivas morais. A partir disso, houve tentativas de erigir uma explicação sólida e coerente de uma moralidade norteadora das normas dissociada de qualquer base transcendental. Entretanto, ao negar a existência de Deus, de acordo com a Cosmovisão Cristã, o homem é encontrado em um mundo resultante da evolução natural (tempo, matéria e acaso). Neste ponto, o problema está na tentativa de se extrair normas morais objetivas de fatos empíricos.[21]

Pois bem, supondo que Adão e Eva não são personagens históricas, ou, pelo menos que não se pode ter certeza da historicidade de alguns acontecimentos de suas vidas, por exemplo, acerca de como e do que exatamente vieram a existir, alguma alternativa deverá preencher o vazio. Na pós-modernidade, esse papel é tomado pela macroevolução, fazendo com que deveres, inevitavelmente, sejam abandonados juntamente com a ontologia da antiga visão de mundo rejeitada, dentre eles os deveres relacionados à sexualidade humana. A ética sexual que relativiza a função dos gêneros depende de uma narrativa metafísica e ontológica derivada de uma teoria das origens que permita ou, no mínimo, que torne aceitável a diversidade sem ferir a natureza humana. A teoria da evolução das espécies é muito útil nesse sentido, ao passo que apresenta homem e mulher como seres em constante mutação.

Alguns anos atrás, a BBC News publicou em seu site uma reportagem sobre a tentativa da ciência de explicar o homossexualismo a partir de uma de uma leitura evolucionista da biologia, em cuja introdução se lê:

Nas duas últimas décadas, dezenas de papers científicos têm sido publicados acerca das origens biológicas da homossexualidade – outro anúncio foi feito semana passada. Está se tornando ortodoxia científica. Mas como isso se encaixa na teoria da evolução de Darwin?[22]

O questionamento lançado sobre “como isso se encaixa na teoria de evolução de Darwin?” é a pergunta para a qual estamos apontando. Não se pretende respondê-la aqui, mas somente demonstrar o fato de que há compatibilidade de narrativas. Esse é o ponto principal: só pode haver justificativa para a relativização da sexualidade se houver uma teoria da origem do ser humano que a torne plausível. Ainda que não se está propondo a literalidade de Gênesis como um teste de ortodoxia cristã, o problema é abrir a brecha da possibilidade. A interpretação literal histórica dos acontecimentos no Éden é totalmente incompatível com a ideologia de gênero. Todavia, uma narrativa macroevolutiva das espécies é perfeitamente compatível, em qualquer corrente que se apresente: neodarwinismo, teoevolucionismo (afinal, qual theos?), etc. A afirmação de que está se tornando ortodoxia científica não deveria surpreender, portanto.

O cantor britânico Sam Smith recentemente veio a público em sua conta no twitter para anunciar “my pronouns are they/them”. Assim ele postou na sua rede social:

Today is a good day so here goes. I’ve decided I am changing my pronouns to THEY/THEM after a lifetime of being at war with my gender I’ve decided to embrace myself for who I am, inside and out…

[…]

P.s. I am at no stage just yet to eloquently speak at length about what it means to be non binary but I can’t wait for the day that I am. So for now I just want to be VISIBLE and open. If you have questions and are wondering what this all means I’ll try my best to explain…

These are activists and leaders of the non binary/trans community that have helped me and given me so much clarity and understanding.[23]

Pois bem, mais uma vez, como já exaustivamente exposto, se a ideia de diversidade sexual não encontra espaço no entendimento binário da narrativa criacional e da ética cristã, ela, necessariamente, irá depender de uma nova visão de mundo: uma que permita seu desenvolvimento lógico, na qual uma explicação viável acerca da natureza ser humano se encaixe na formatação dialética da ideologia de gênero. O humanismo secular oferece essa condição, pois parte de uma narrativa de síntese para a origem da vida e da natureza humana fundada no naturalismo científico. James Sire chama o humanismo secular de “naturalismo na prática[24].  Abrem-se as portas necessárias para o estabelecimento de identidades sexuais não binárias. As definições de identidades não-binárias do movimento LGBT+  é uma expressão exata desse fato. O “não-binarianismo sexual” é a síntese dialética da sexualidade humana. Conforme o caso de Sam Smith, nos países de língua inglesa, as pessoas que assim se identificam desejam ser chamadas de “they/them”, pois esse é um pronome plural da terceira pessoa que vale para homens, mulheres, ou grupo de ambos os sexos, uma síntese de gêneros.

Fato é que a homossexualidade sempre existiu na história da humanidade, o que a própria Bíblia relata já em Gênesis 19. Contudo, em várias culturas era vista como um ato, ou um estilo de viver. Para a moralidade judaico-cristã, trata-se de um pecado, resultado da queda. A correlação com a identidade do indivíduo desligada de sua biologia é algo novo que ocorre na sociedade ocidental da atualidade. Isso é fruto de uma cultura que absorveu uma maneira peculiar de ver e interpretar o mundo, a existência, o ser humano, a si mesmo. Uma cosmovisão majoritária que oferece uma metanarrativa de começo impessoal, regida pelo acaso, resumida à matéria, sem propósitos previamente estabelecidos, e em constante transformação, enseja tal leitura dialética da sexualidade.

No filme A Origem (título original, Inception) – Dominick Cobb, personagem de Leonardo DiCaprio, é pago para colocar na cabeça de um jovem executivo, por meio de sonhos induzidos, uma ideia que irá comprometer o império econômico legado de seu pai. No início do longa-metragem, podemos encontrar as seguintes linhas:

Qual o parasita mais resistente? Uma bactéria, um vírus, um verme intestinal? A ideia! Uma vez que a ideia controla sua mente, é quase impossível  resistir. […]

A questão não é de profundidade. Você precisa da versão mais simples da ideia a fim de que ela cresça naturalmente na mente do seu sujeito. É um ato sutil.[25]

Juntamente com outros conceitos acolhidos pelo humanismo secularista, a ideia de um ser humano como síntese de mutações biológicas trouxe consequências à civilização ocidental, pois colaborou para o enfraquecimento do legado ético de uma cultura que até então havia resistido por milênios. O abalo foi sentindo em todas as áreas da natureza e das relações humanas. A sexualidade não saiu ilesa. [26]

 Conclusão

No primeiro item do artigo restou demonstrada que a ética sexual cristã é uma conclusão coerente de sua cosmovisão. A importância de cada elemento de uma visão de mundo se dá pelos desdobramentos lógicos de seus enunciados. Os pressupostos metafísicos, ontológicos, epistemológicos e éticos se conectam de forma indissociável. A fé cristã tem seus quatro pilares fundamentais na metanarrativa da criação, queda, redenção e consumação. A moralidade relacionada às relações humanas parte da sua teologia criacional. Adão e Eva históricos criados à imagem e semelhança de Deus com propósitos biológicos, sociais e espirituais pré-definidos e permanentes entregam à humanidade uma natureza definida de gênero, bem como o cumprimento de certa ética em sua sexualidade.

Na segunda parte do texto, buscou-se destacar a antítese como outro aspecto fundamental da cosmovisão cristã com consequências diretas na sua ética sexual.  A característica da antitética é a oposição inconciliável de duas teses. Ela é, na definição simples de Dooyeweerd, oposição. Se a antítese é o antagônico, o contrário que não aceita a possibilidade de mistura com aquilo que lhe é oposto, a síntese, por sua vez, é o germe de teses opostas que formam uma nova tese conjunta. No pensamento cristão, as verdades e os pressupostos fundamentais são antitéticos, inegociáveis,  e jamais a síntese do exercício dialético.

O terceiro ponto deste trabalho expôs que a ideologia de gênero não poderia ter desenvolvido sua tese de diversidade sexual em uma cultura majoritariamente cristã, justamente por causa da rigidez da ética cristã sexual derivada do livro de Gênesis e da mentalidade antitética que permeava a cristandade. Foi somente com advento do humanismo secular, como resultado tardio das bases históricas no movimento Renascentista e no Iluminismo Racionalista, que a ideologia em questão encontrou solo para produção intelectual e aceitação na sociedade. Deste ponto, podemos, então, partir para algumas reflexões conclusivas importantes a respeito da temática proposta.

O humanismo secular e pós-cristão apresenta-se como adepto necessário da dialética religiosa, nos termos apresentados por Dooyeweerd, em que “o resultado é que ela impulsiona o pensamento e a prática da vida de um lado para o outro”. Muito interessante o reconhecimento do Movimento Nacional Holandês, que, em 12 de maio de 1945, “fez um apelo aos holandeses num manifesto que decisivamente rejeitava a antítese cristã”[27],  no seguintes termos:

Para promover a sua própria comunidade nacional e para manter um lugar digno entre as nações, o povo dos Países Baixos precisa, acima de tudo, de uma renovação espiritual alimentada pelas nascentes do cristianismo e do humanismo que sempre foram nossas fontes de força. […] Especificamente, a antítese cristã e a luta de classes postulada pelo marxismo já não são princípios úteis para a solução dos problemas sociais de hoje…

Herman Dooyeweerd abre sua obra Raízes da Cultura Ocidental justamente comentando a declaração acima, demonstrando a importância do tema para a obra:

O apelo do Movimento Nacional Holandês, de fato, deu-lhes uma forma específica. Em vez de uma antítese entre as visões cristãs e humanistas da vida, o apelo recomendava uma síntese. Isso apelava para a unificação, em vez de para uma oposição absoluta, de modo que a força da nação holandesa, que tinha sido alimentada pelas tradições espirituais tanto do cristianismo quanto do humanismo, pudesse então ser agrupada novamente na unidade nacional.[28]

Ora, isso que o Movimento Nacional Holandês propôs no século passado nada mais é do que a repetição do culto ao Imperador de Roma: cada um poderia adorar seus deuses locais, mas todos teriam de declarar que César é κύριος. O culto romano e o humanismo da Holanda pós-guerra apresentam propostas idênticas de síntese entre suas cosmovisões e o cristianismo. E a tensão entre César e Cristo é a mesma que hoje existe entre o humanismo secular e a antítese cristã. Porém, como Dooyewerd destaca, a dialética religiosa carece de síntese real, posto que “a conciliação torna-se impossível por causa do próprio motivo básico”. Tanto para César como para o Movimento Nacional Holandês, não há que se combater o que se pode imiscuir, pois promiscuidade é parte dos seus axiomas dialéticos. Ou seja, a síntese proposta é, na verdade, a imposição dos seus próprios valores.

Jordan Peterson, psicólogo canadense e professor universitário, ganhou notoriedade ao se recusar a utilizar os pronomes neutros em cumprimento do Bill C-16, aprovado pelo Parlamento do Canadá, que proíbe discriminação com base de identidade de gênero e expressão, conforme a Lei de Direitos Humanos do Canadá. Veja como o professor revela o que aqui estamos a destacar, de que apesar de a ideologia de gênero apresentar uma leitura dialética da natureza e da sexualidade humana, ela acaba por tentar se impor sobre que lhe opõe. Segundo reportagem da BBC, esta é a posição de Dr. Peterson:

Dr. Peterson diz que ele não se opõe às pessoas trans ou à escolha de qual pronome tradicional eles preferem.

“Se a pessoa transexual padrão deseja ser considerada como ele ou ela, meu senso é que eu irei me referir a você de acordo com a parte que você parece estar atuando”, ele disse.

Mas ele argumenta que termos como “identidade de gênero”, e “expressão de gênero” são muito amplos, são as “proposições de construcionismos sociais radicais”, e estão sendo usados para intimidar oponentes à submissão.[29]

Hoje é comum ouvirmos falar da modalidade de cristão gay, e isso ao mesmo tempo que se nota um combate à ideia de família tradicional cristã. Isto é, há uma ideia de síntese entre cristianismo e diversidade sexual que sucumbe à realidade de que são teses inconciliáveis. É preciso estar atento ao fato de que, assim como Roma tentou colocar os primeiros cristãos debaixo de seu guarda-chuva por meio da mistura de religiões, e na Holanda se propôs a uma síntese da antítese cristã com o humanismo a fim de uma suposta unidade nacional, a síntese da ética sexual cristã com a ideologia de gênero nada mais faz que submeter a fé à ideologia.

Rosaria Butterfield, em seu artigo What is wrong with gay Christianity? What is Side A and Side B anyway?[30], traz-nos esse fato de maneira de maneira pontual:

No início dos anos 2000, pessoas com atração persistente e duradoura pelo mesmo sexo se juntaram debaixo do guarda-chuva do termo cristão gay. Eles são apoiados pelo Gay Christian Network, ou Side A (que sanciona casamento do mesmo sexo e acredita que homossexualidade é apenas uma das muitas formas da diversa sexualidade que a igreja deveria aceitar), e a comunidade inter-rede de Amizade Espiritual, ou Lado B (que acredita que homossexualidade não é uma questão moralmente culpável, ainda que seja uma consequência do quebrantamento da Queda; Side B ensina contra a prática sexual homossexual, mas somente por respeito à tradição Cristã). Enquanto o Side B busca abraçar padrões sexuais bíblicos, porque vê orientação sexual como uma categoria acurada da personalidade (i.e., existe tal coisa qual uma pessoa gay – essa condição de gay descreve quem alguém é na essência), sua teologia não permite de qualquer maneira um entendimento de por que homossexualidade, até mesmo em nível do desejo, é pecaminoso e necessita de graça e arrependimento. Para o Cristão Side B, homossexualidade é uma sexualidade – uma de muitas.

[…]

Ao passar dos anos, nós temos visto muitos Cristãos do Side B desertar para o  Side A, declarando que Deus sanciona uniões gays. E eu predigo que veremos muitos mais desertores, desde que a teologia atrás do Side B é biblicamente insustentável. Como qualquer um de nós pode lutar contra um pecado que não odiamos? Ao mesmo tempo, precisamos separar-nos do pecado que odiamos. Isso pode ser um problema muito desafiador para um cristão que experimenta atração pelo mesmo sexo, um problema que se torna excessivamente mais desafiador se alguém pressupõe a identidade social de “cristão gay”.

A religião é antitética por natureza. E sendo a ideologia de gênero parte de uma visão de mundo particular, ela, de igual modo, acaba por revelar sua antítese religiosa, pois o próprio emprego de uma leitura dialética da realidade em sua integralidade torna-se antitético. Os que se enveredam para outras visões de mundo, ao mesmo tempo que tentam manter o passo em dois caminhos, acabam caindo completamente para um dos lados. Como Dooyeweerd sinalizou: “a dialética religiosa carece de síntese real”. Por isso, Butterfield foi ao âmago da questão: “a teologia atrás do Side B é biblicamente insustentável. Como qualquer um de nós pode lutar contra um pecado que não odiamos?”.

Encaminhando-se ao final destas reflexões conclusivas, vale citar a lição de John Frame, em seu livro “A History of Western Philosophy and Theology”, no qual o autor ensina que as heresias na história da Igreja seguem um padrão que se inicia na síntese entre as Escrituras com uma filosofia não-cristã. Logo, então, vem a urgência de lidar com o problema, emergindo um reformador para liderar os ortodoxos através das verdades fundamentais, e finalmente um consolidador após a controvérsia para repensar a teologia a partir do conhecimento adquirido.[31]

O que deve preocupar os pensadores cristãos da atualidade, portanto, não é a ideologia de gênero em si, sua cosmovisão humanista, ou a sua leitura dialética da natureza humana. Esses são, na verdade, problemas dos secularistas que creem nessas coisas. O que precisa ocupar nossos estudos é a pureza da Palavra de Deus e a atenção permanente contra tentativas de síntese da fé cristã com outras filosofias, dentre as quais, o naturalismo filosófico e o humanismo secular, que se apresentam como as maiores ameaças da atualidade à cosmovisão cristã.[32]

Neste artigo expomos a visão de mundo que sustenta a ideologia de gênero a fim de alcançarmos uma compreensão mínima que sua complexidade merece, contrastá-la com a ética sexual cristã e, finalmente, demonstrar que a fidelidade à autoridade das Escrituras não oferece espaço para distorções no ensino bíblico a respeito de homem, mulher e seus papéis designados pelo Criador. Homossexualidade não é algo novo na história da humanidade, e combatê-la não é o objetivo final do cristão, mas sim o é erguer o estandarte do puro evangelho que carrega a verdade que, por si só, tem o poder de afastar todo o erro e pecados que lhe são opostos, inclusive aqueles relacionados à sexualidade. Todavia, é momento de enfrentar o enfraquecimento epistemológico que o cristianismo enfrenta por conta de tentativas de síntese com o cientificismo humanista secular.

É louvável a iniciativa de muitos cristãos sinceros em desejar participação efetiva no mundo científico. Seus esforços nos campos específicos do conhecimento devem ser respeitados e encorajados. No entanto, a mesma suspeita que cientistas podem ter de uma aproximação amadora dos teólogos acerca de pesquisas científicas complexas, os teólogos podem ter dos cientistas quando estes lidam com teorias que possuem profundas implicações teológicas, filosóficas e éticas.

 Cabe-nos, assim, ressoar o alerta de J.P. Moreland, quando diz que “a adoção da evolução teísta tem minado a autoridade da doutrina e do ensino ético bíblico”. Trata-se de um ponto delicado, e que toca a convicção de muitos estudiosos cristãos, seja das ciências naturais, da teologia, ou da filosofia. A macroevolução tem sido considerada por mais de um século como uma explicação plausível (talvez a única na academia científica) para o desenvolvimento da vida na terra e da humanidade, mas que até hoje não encontrou sua prova cabal. Design inteligente e a complexidade irredutível, por sua vez, são teorias que têm ganhado força e conquistado adeptos no meio científico, e oferecem uma alternativa de aproximação ao criacionismo cristão ortodoxo, ainda que não sejam necessariamente ligadas a uma divindade específica. Fé e ciência são compatíveis. Até porque a verdadeira ciência só pode ser derivada de Deus, pois ele é a metafísica infinita, revelador da verdadeira epistemologia, que confere ordem à criação, a única base da boa ética, reflexo do caráter do seu ser.

Enfim, os desdobramentos éticos das hipóteses sobre as origens não podem ser negados. No caso deste estudo, tais implicações foram aplicadas ao campo da sexualidade, buscando-se desvendar suas consequências tanto para a moral cristã quanto para o surgimento da ideologia de gênero. Tal discussão é inevitável, devendo os cristãos dar continuidade a ela nos diversos campos de estudo e da ciência em que estão envolvidos, proporcionando diálogos saudáveis e produtivos em todas as áreas do saber da natureza e das relações humanas, especialmente acerca deste tópico da sexualidade. Espera-se que o presente artigo acabe por estimular o bom debate.

Fé, ética e ciência são amigas inseparáveis quando submetidas às verdades das Escrituras reveladas pelas três Testemunhas da criação.

SDG

_________________________
[1] SIRE, James W. The Universe Next Door: a basic worldview catalog. 4ª ed. Downers Gove/IL, InterVarsity Press, 2004. Os conceitos apresentados neste artigo sobre cosmovisão são tratados nesta obra.

[2] BARRS, Jerram. Francis Shaeffer: the man and his message. Reformation 21: The Online Magazine of the Alliance of Confessing Evangelicals. Edição de novembro de 2006. Disponível em https://www.covenantseminary.edu/francis-schaeffer-the-man-and-his-message/. Acesso em 20 de setembro de 2018.

[3] DOOYEWEERD, Herman. Raízes da Cultura Ocidental. São Paulo, Ed. Cultura Cristã, 2015, p. 55.

[4] Todas citações bíblicas neste artigo são extraídas da versão João Ferreira de Almeida Revista e Atualizada. Disponível em: https://www.bibliaonline.com.br/ara. Acesso em 29 de setembro de 2019.

[5] MORELAND, J.P. How Theistic Evolution Kicks Christianity Out of the Plausibility Structure and Robs Christians of Confidence that the Bible is a Source of Knowledge. En (editores). MORELAND, J.P.; MEYER, Stephen C.; SHAW, Christopher; GAUGER, Ann K.; GRUDEM, Wayne. Theistic Evolution – A Scientific, Philosophical, and Theological Critique. Wheaton/IL,  Crossway, 2017, p. 633. (Tradução minha)

[6] Idem, p. 635 e 636.

[7] Ibidem, p. 658.

[8] DOOYEWEERD, Herman. Raízes da Cultura Ocidental. São Paulo, Ed. Cultura Cristã., 2015, p. 20.

[9] A macroevolução, na qual o surgimento de novas espécies se dá a partir de espécies pré-existentes, é uma teoria que carece de prova definitiva. O ponto que se faz neste artigo acerca do assunto ao tratar de Gênesis e criação é que há um inegável preço teológico, filosófico e ético a ser pago pelo teoevolucionismo, com implicações ao tema que aqui nos interessa acerca da moralidade sexual.

[10] DOOYEWEERD, Herman. Raízes da Cultura Ocidental. São Paulo, Ed. Cultura Cristã. 2015, p. 16.

[11] SCHAEFFER, Francis A. How Showld We Then Live? The rise and decline of western thought and culture. Wheaton/IL, Crossway, 1983, p. 163. (Tradução minha)

[12] DOOYEWEERD, Herman. Raízes da Cultura Ocidental. São Paulo, Ed. Cultura Cristã, 2015, p. 27.

[13] Idem, p 25.

[14] Ibidem, p. 27.

[15] No Facebook do Reino Unido, por exemplo, já em 2014, 71 possibilidades de identidade sexual eram encontradas na configuração de perfil pessoal. Disponível em https://www.telegraph.co.uk/technology/facebook/10930654/Facebooks-71-gender-options-come-to-UK-users.html, acesso em 21 de setembro de 2019.

[16] SIRE, James W. The Universe Next Door: a basic worldview catalog. 4a ed. Downers Gove/IL, InterVarsity Press, 2004, p 84.

[17] FRAME, John M. A History of Western Philosophy and Theology. Phillisburg/NJ, P&R Publishing, 2015, p. 756. (Tradução minha).

[18] KELLER, Timothy. The Reason For God: belief in an age of skepticism. New York/NY, Penguin Group, 2008, p. 13.

[19] ROBERT L. Thoburn. The Children Trap: The Biblical Blueprint for Education. Oregon City,  Dominion Press, 1986, pg. 81-82. Tradução do trecho de Felipe Sabino, disponível em: http://www.monergismo.com/textos/educacao/todo-mundo-religiao_robert-thoburn.pdf, acesso em 21 de setembro de 2019.

[20] SIRE, James W. The Universe Next Door: a basic worldview catalog. 4a ed. Downers Gove/IL, InterVarsity Press, 2004, p. 215. (Tradução minha).

[21] BONISSONI, Natammy Luana de Aguiar. A inviabilidade de subsistência de um ambiente multicultural Laico. Tese submetida ao curso de Doutorado em Ciência Jurídica da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, em dupla titulação com o Douttorato di ricerca in Scienze Giuridique, da Universidade de Perugia, como requisito parcial à obtenção de título de Doutor em Ciência Jurídica, 2017, p. 52.

[22] Disponível em: https://www.bbc.com/news/magazine-26089486. Acesso em 17 de setembro de 2019. (Tradução minha).

[23] Disponível em: https://twitter.com/samsmith/status/1172519872464662530. Acesso em 21 de setembro de 2019.

[24] SIRE, James W. The Universe Next Door: a basic worldview catalog. 4a ed. Downers Gove/IL, InterVarsity Press, 2004, p 76.

[25] A ORIGEM (Título original: Inception). Direção: Chistopher Nolan. EUA/Reino Unido. Legendary Pictures, Syncopy Films, 2010. 148 min. (Tradução minha)

[26] O autor deste artigo está ciente de importantes teólogos e instituições cristãs que defendem o evolucionismo teísta, portanto não se tem a intenção de atacar a credibilidade destes, que, inclusive, subscrevem à ética sexual cristã histórica e até militam contra a ideologia de gênero. O ponto é demonstrar que a possibilidade de desdobramento lógico inexistente na interpretação literal de Gênesis no que diz respeito a “cada animal  segundo a sua espécie” torna-se plausível se entendermos que o ser humano é uma espécie em evolução, abrindo a brecha de narrativa necessária para a ideologia de gênero. Inclusive, Tim Keller, em seu artigo “Criação, Evolução e Cristãos Leigos”, publicado no Brasil pela Associação de Cristãos na Ciência (https://www.cristaosnaciencia.org.br/recursos/criacao-evolucao-e-cristaos-leigos-tim-keller-parte-1/) defende que é possível crer em evolução como um processo biológico sem ter de, necessariamente,  acreditar na Grande Teria da Evolução, ou seja, em evolucionismo como uma cosmovisão. É digno ainda de menção o argumento evolucionário contra o naturalismo, de Alvin Plantinga, que também é explicado no artigo citado. No entanto, o que o presente texto pretende colocar no tocante ao tema em debate é a possibilidade de racionalização de uma narrativa que a teoria da evolução proporciona para a relativização da ética sexual.

[27] DOOYEWEERD, Herman. Raízes da Cultura Ocidental. São Paulo, Ed. Cultura Cristã. 2015, p. 13

[28] Idem, p. 13-14.

[29] Disponível em https://www.bbc.com/news/world-us-canada-37875695.  Acesso em 25 de setembro de 2019. (Tradução minha).

[30] Butterfield, Rosaria C.  What is wrong with gay Christianity? What is Side A and Side B anyway? Disponível no site https://rosariabutterfield.com/new-blog/2018/2/14/what-is-wrong-with-gay-christianity-what-is-side-a-and-side-b-anyway. Acesso em 06 de junho de 2019. (Tradução minha).

[31] FRAME, John M. A History of Western Philosophy and Theology. Phillisburg/NJ, P&R Publishing, 2015, p. 170-171. (Tradução minha).

[32] Frame aponta que o platonismo cristão de Orígenes levou à visão de Ário que o Filho de Deus é um ser criado; Atanásio tem uma luta histórica contra um Império arianizado, seguida pela reconstrução teológica de Agostinho. No paralelo do século XVI, o escolásticismo medieval se apresentava como uma síntese entre a Bíblia, Platão e Aristóteles, o que levou à heresia da salvação pelas obras – com seu extremo em Tetzel. Lutero forçou o princípio da justificação pela fé somente, e Calvino consolidou a doutrina. Aliás, Frame aponta que a própria disputa entre Galileu Galilei e a Igreja Católica não foi um debate entre a Bíblia e a ciência, e sim entre os modelos cosmológicos de Aristóteles e Copérnico: “A Renascença não foi um tempo de descrença. Todos os pensadores que eu mencionei professavam o Cristianismo. Mas a Bíblia não tinha um papel central nos seus pensamentos (exceto como um objeto para os acadêmicos textuais analisarem). No famoso encontro entre Galileu e a igreja sobre heliocentrismo, nenhuma das partes se referia muito às Escrituras. O conflito não era tanto sobre a ciência e a Bíblia quanto o era sobre a ciência e a cosmologia Aristotélica que a igreja tinha imposto sobre a Bíblia. Ainda que os pensadores da Renascença tivessem novas ferramentas linguísticas e textuais para entender as Escrituras, nenhum deles (até a Reforma) desafiou as pressuposições filosóficas e culturais com a cosmovisão da Bíblia.” FRAME, John M. A History of Western Philosophy and Theology. Phillisburg/NJ, P&R Publishing, 2015, p. 167. (Tradução minha). Ou seja, não se tratava de um conflito entre fé e ciência, e sim de um problema advindo da síntese das Escrituras com filosofia humana que se tomou como ciência. Ainda, é bom lembrar que o próprio Galileu foi um Cristão devoto até o fim de sua vida, e nunca viu um divórcio da religião e ciência, mas apenas um casamento saudável. Nas suas palavras, “Deus é conhecido pela natureza em suas obras, e pela doutrina na Palavra revelada”. Ou seja, Galileu Galilei, que defendeu o heliocentrismo, acreditava na Bíblia. https://www.christianitytoday.com/…/sc…/galileo-galilei.html

 

 

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