Teologia do coaching

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“As suas casas passarão a outrem, os campos e também as mulheres, porque estenderei a mão contra os habitantes desta terra, diz o SENHOR, porque desde o menor deles até ao maior, cada um se dá à ganância, e tanto o profeta como o sacerdote usam de falsidade. Curam superficialmente a ferida do meu povo, dizendo: Paz, paz; quando não há paz. Serão envergonhados, porque cometem abominação sem sentir por isso vergonha; nem sabem que coisa é envergonhar-se. Portanto, cairão com os que caem; quando eu os castigar, tropeçarão, diz o SENHOR. Assim diz o SENHOR: Ponde-vos à margem no caminho e vede, perguntai pelas veredas antigas, qual é o bom caminho; andai por ele e achareis descanso para a vossa alma; mas eles dizem: Não andaremos.” – Jeremias 6.12-16

 1. Introdução 

Meus irmãos, foi-me pedido para lhes falar nesta noite a respeito de um assunto que tem gerado muitas discussões nas redes sociais: a Teologia Coaching. Permitam-me iniciar com um breve desabafo. Particularmente, uma das minhas grandes tristezas enquanto pastor, foi tomar conhecimento através das redes sociais, de uma ex-ovelha minha, a quem ensinei durante uns dois anos, ter-se tornado, como ele mesmo se descreve: “Master Coach”, e estar visitando igrejas a convite, a fim de palestrar para os membros dessas igrejas sobre como podem ser versões melhores de si mesmos.

Eu fiz algumas leituras e ouvi alguns podcasts a respeito do assunto, e um ponto em comum abordado nos artigos que li e nos podcasts que ouvi, é a associação entre a Teologia do Coaching e a Teologia da Prosperidade. Destaca-se, por exemplo, que as duas são antropocêntricas. Nelas o homem é o centro. Não obstante, apesar desse ponto de contato, há quem afirme que a Teologia do Coaching é ainda pior do que a Teologia da Prosperidade. Nesta há a barganha, através da qual Deus realizará milagres, a fim de trazer prosperidade material à pessoa. Podemos observar, meus irmãos, que mesmo na Teologia da Prosperidade, Deus é essencial e o homem continua dependente dele para obter aquilo que deseja. Já na Teologia do Coaching a barganha é eliminada, não porque seja errado, mas porque Deus é empurrado para longe. Deus se torna secundário. O homem, seu esforço e seu potencial é o que ocupa o primeiro lugar na Teologia do Coaching. Nesta, meus irmãos, Deus se torna a pessoa que ama tanto você, que está na torcida, vibrando e torcendo pela tua felicidade.

Em nosso estudo a respeito dessa nova onda que tem invadido muitas igrejas nós vamos seguir um roteiro definido de três pontos: 1. Veremos o que é o Coaching e como ele é realizado; 2. Veremos como o Coaching foi assimilado por uma grande parcela do evangelicalismo. 3. Observaremos o que está no fundamento do Coaching – bem como no da Teologia da Prosperidade.

2. EXPOSIÇÃO

2.1. O que é o coaching?

No site do Instituto Brasileiro de Coaching é possível encontrar algumas definições do que vem a ser o coaching: “Coaching é um processo, uma metodologia, um conjunto de competências e habilidades que podem ser aprendidas e desenvolvidas por absolutamente qualquer pessoa para alcançar um objetivo na vida pessoal ou profissional, até 20 vezes mais rápido, comprovadamente”.[1] No site também é possível ler que o coaching

é um processo definido como um mix de recursos que utiliza técnicas, ferramentas e conhecimentos de diversas ciências como a administração, gestão de pessoas, psicologia, neurociência, linguagem ericksoniana, recursos humanos, planejamento estratégico, entre outras. A metodologia visa a conquista de grandes e efetivos resultados em qualquer contexto, seja pessoal, profissional, social, familiar, espiritual ou financeiro.

Quando eu li essa última definição, fiquei curioso a respeito do que seria a “linguagem ericksoniana” e resolvi pesquisar um pouco mais. A “linguagem ericksoniana” é uma referência a Milton Erickson, um psiquiatra americano, considerado como “o pai da hipnose moderna” e uma das autoridades por trás da programação neurolinguística. A diferença entre a hipnose praticada e ensinada por Erickson e a praticada e ensinada por Freud está em que, na hipnose ericksoniana não há aquele estado de transe ou entorpecimento da pessoa hipnotizada. Trata-se de uma hipnose consciente, em que tudo se processa através de mecanismos de linguagem, que proporcionam ao hipnoterapeuta o controle da situação, induzindo o seu paciente através de sugestões que são feitas.

Um Coach brasileiro chamado José Roberto Marques afirma o seguinte a respeito da linguagem ericksoniana:

A sutileza da linguagem ericksoniana está no fato de que os conteúdos não devem ser inteiramente depositados sobre o paciente/coachee, tolhendo ou determinando sua assimilação. Na linguagem ericksoniana não dizemos “não faça isso” ou “faça isso”, mas “faz sentido para você isso ou aquilo?”, ou seja, plantamos sugestões na mente das pessoas. Aquele que estiver submetido ao processo deve ser instruído ou induzido de modo nada impositivo, a fim de que mantenha sua liberdade de escolha preservada. Um dos maiores riscos em que pode incorrer o coach é introduzir sugestões que possam atrapalhar o aprofundamento do transe, ou potencializar as resistências ao tratamento.[2]

No site do Instituto Brasileiro de Coaching esse “processo” é descrito da seguinte forma:

Conduzido de maneira confidencial, o processo de coaching é realizado através de sessões, onde um profissional chamado Coach tem a função de estimular, apoiar e despertar em seu cliente, Coachee, o seu potencial infinito para que este conquiste tudo o que deseja. As sessões de coaching podem ser individuais ou em grupo, podem ser realizadas semanalmente, quinzenalmente ou mensalmente e tem duração, em média, de uma a duas horas, tudo isso definido em comum acordo entre coach e coachee.

Para finalizar essa breve exposição do que é o Coaching, basta dizer que ele se divide em dois tipos (pessoal e profissional), cada tipo possuindo oito subtipos. O coaching pessoal se subdivide em: 1. Familiar; 2. de Relacionamento; 3. Espiritual; 4. Financeiro; 5. Esportivo; 6. de Emagrecimento; 7. de Inteligência Emocional; e 8. Nutricional. Já o coaching profissional se subdivide em: 1. Corporativo; 2. para Concursos; 3. de Carreira; 4. de Equipes; 5. de Vendas; 6. de Empreendimento; 7. de Recrutamento; e 8. de Liderança.

O coaching espiritual, por exemplo, é definido da seguinte forma:

O Coaching Espiritual não tem ligação com religião, doutrina ou crença. O Coaching Espiritual tem como foco, proporcionar o equilíbrio entre a paz interior do indivíduo e com o universo em si. A metodologia age de dentro para fora, atuando nas questões internas da pessoa e no seu autoconhecimento. Portanto, o Coaching Espiritual auxilia o ser humano a identificar suas crenças e valores, a reconhecer a sua missão e propósito de vida, a acreditar em si mesmo, a ter amor próprio, a superar limites e assim, deixar um legado positivo, seja em âmbito pessoal ou profissional.

A Teologia do Coaching é exatamente a apropriação e leve modificação dessa definição de Coaching Espiritual.

2.2. O coaching e as igrejas evangélicas

Não se sabe exatamente o momento em que a Teologia do Coaching invadiu as igrejas evangélicas. Apesar disso, tudo o que era preciso para que ela virasse uma sensação já estava assentado pelos movimentos que a precederam, como o movimento de autoajuda e a Teologia da Prosperidade. Uma vez que a base humanista já estava assentada, a Teologia do Coaching não encontrou tanta resistência.

Como mencionei há pouco, a definição do Coaching Espiritual apresenta os elementos existentes na Teologia do Coaching. Poderíamos defini-la assim:

A Teologia do Coaching tem como foco, proporcionar o equilíbrio entre a paz interior do indivíduo e com Deus. A metodologia age de dentro para fora, atuando nas questões internas da pessoa e no seu autoconhecimento. Portanto, a Teologia do Coaching auxilia a pessoa a identificar suas crenças e valores, a reconhecer a sua missão e propósito de vida, a acreditar em si mesmo, a ter amor próprio, a superar limites e assim, deixar um legado positivo, seja em âmbito pessoal ou profissional.

Isso pode ser aferido a partir do momento em que você observa o discurso daqueles que se apresentam como coaches. Tome, por exemplo, os títulos de publicações dos principais representantes desse segmento no Brasil. O famigerado Tiago Brunet possui vários livros publicados, dentre os quais podemos citar: Especialista em Pessoas: Soluções Bíblicas e Inteligentes para Lidar com Todo Tipo de Gente; Descubra o Maior Poder do Mundo: Tudo de que Você Precisa para Ter uma Vida Extraordinária; Descubra o seu Destino: As Chaves que Abrem as Portas para o seu Futuro; Emoções Inteligentes: Governe sua Vida Emocional e Assuma o Controle da sua Existência. Já é bastante conhecida a horrorosa afirmação feita por ele numa palestra, no sentido de que, sim, é verdade que Deus planejou o nosso destino, porém, as nossas decisões podem alterá-lo. De acordo com ele, Deus tem o lápis do destino em suas mãos, mas o homem tem a borracha das decisões. Ele diz mais: “A vontade de Deus só se cumpre quando você, por livre-arbítrio, coloca tudo na mão dele”. Meus irmãos, esse tipo de afirmação possui sérias consequências para a teontologia, a doutrina do Ser e das obras de Deus. Ela priva Deus de sua soberania, colocando-a nas mãos do ser humano. Ela apresenta uma divindade completamente distinta do Deus triúno revelado nas Sagradas Escrituras. Aquele que declara, em Isaías 46.9-10: “Lembrai-vos das coisas passadas da antiguidade: que eu sou Deus, e não há outro, eu sou Deus, e não há outro semelhante a mim; que desde o princípio anuncio o que há de acontecer e desde a antiguidade, as coisas que ainda não sucederam; que digo: o meu conselho permanecerá de pé, farei toda a minha vontade”. Não há borracha do destino que permaneça de pé diante da afirmação de Deus: “o meu conselho permanecerá de pé”! O deus apregoado por Tiago Brunet é completamente distinto daquele que foi confessado por um rei pagão, como Nabucodonosor: “Mas ao fim daqueles dias, eu, Nabicodonosor, levantei os olhos ao céu, tornou-me a vir o entendimento, e eu bendisse o Altíssimo, e louvei, e glorifiquei ao que vive para sempre, cujo domínio é sempiterno, e cujo reino é de geração em geração. Todos os moradores da terra são por ele reputados em nada; e, segundo a sua vontade, ele opera com o exército do céu e os moradores da terra; não há quem lhe possa deter a mão, nem lhe dizer: Que fazes?” (Daniel 4.34-35). Não há como conciliar a divindade anunciada por Tiago Brunet com aquele Todo-poderoso que, de acordo com Tiago, é dele que depende a realização de tudo aquilo que planejamos: “Atendei, agora, vós que dizeis: Hoje ou amanhã, iremos para a cidade tal, e lá passaremos um ano, e negociaremos, e teremos lucros. Vós não sabeis o que sucederá amanhã. Que é a vossa vida? Sois, apenas, como neblina que aparece por instante e logo se dissipa. Em vez disso, devíeis dizer: Se o Senhor quiser, não só viveremos, como também faremos isto ou aquilo” (4.13-15).

Outro bem conhecido coach no meio evangélico, apresentar de se apresentar como pastor, é Deive Leonardo, a exemplo de Tiago Brunet, um autor best seller no Brasil. Já há algum tempo eu assisto “pregações” de Deive Leonardo e leio livros dele. No primeiro livro publicado, O Amor mais Louco da História, que é uma coletânea de mensagens pregadas por ele, Deive Leonardo faz algumas das afirmações mais absurdas que já tive a oportunidade de ler. Por exemplo, ecoando uma das suas preleções que mais agitaram as redes sociais, falando sobre Judas, ele faz algumas afirmações bem complicadas: “Judas pode até ter sido um bom discípulo durante o tempo que andou com Jesus, mas ninguém nunca soube, porque na noite em que O entregou à morte, ele invalidou todas as suas obras”.[3] Ninguém nunca soube? Basta ler a oração sacerdotal de Jesus, em João 17, para encontrarmos lá a informação de que tudo o que aconteceu a Judas foi para que “e nenhum deles se perdeu, exceto o filho da perdição, para que se cumprisse a Escritura” (v. 12). Além disso, Judas nunca foi um bom discípulo. Ele sempre foi um ladrão: “Mas Judas Iscariotes, um dos seus discípulos, o que estava para trai-lo, disse: Por que não se vendeu este perfume por trezentos denários e não se deu aos pobres? Isto disse ele, não porque tivesse cuidado dos pobres; mas porque era ladrão e, tendo a bolsa, tirava o que nela se lançava” (João 12.4-6). Mas, Deive Leonardo continua: “Por isso, ainda que em certa altura tivesse se arrependido, ele não sabia o que fazer com aquele arrependimento, porque não havia entendido o amor por trás de Jesus”.[4] Em nenhum lugar as Sagradas Escrituras atribuem arrependimento a Judas. Mateus 27.3 diz que Judas estava “tocado de remorso”. É interessante que a palavra traduzida como “remorso” (μεταμέλομαι) é considerada um sinônimo para a palavra comumente traduzida como “arrependimento” (μετανοέω). Não obstante, o Thayer’s Greek Lexicon apresenta uma explicação extremamente importante a respeito da diferença entre essas palavras:

As distinções tão frequentemente estabelecidas entre essas palavras, no sentido de que a primeira expressa uma mudança meramente emocional, enquanto a segunda uma mudança de escolha; a primeira se refere a particulares, enquanto a segunda ao todo da vida; a primeira não significa nada além de remorso, enquanto a última fala da reversão do propósito moral conhecida como arrependimento […] μετανοέω é o termo mais completo e mais nobre, expressivo de ações e questões morais.[5]

Podemos concluir, portanto, que Judas nunca se arrependeu da sua malignidade. No máximo, ele foi tomado de remorso por perceber, como ele mesmo expressou, que pecou traindo “sangue inocente” (Mateus 27.4). Mas não houve nenhuma mudança de mente, de coração, de propósito moral.

Deive Leonardo faz a seguinte afirmação, talvez a mais bizarra de todas:

Judas poderia ter revertido aquela situação, mas não o fez. Ele só precisava ter esperado três dias, porém, apesar do arrependimento, ele não foi capaz de enxergar reversão para o que havia feito. Algumas vezes, eu fico imaginando o que poderia ter acontecido se eu tivesse a chance de encontrar Judas bem no momento em que ele saiu arrependido, jogou as moedas e se livrou de aquilo que o prendia. Eu queria tê-lo encontrado naquele momento. E se eu o encontrasse, diria: “Judas, fique calmo!”. Ele, por outro lado, provavelmente diria: “Não! Eu destruí a minha vida. Eu acabei com tudo! E agora vou me suicidar!” Eu, mais uma vez, insistiria para que ele mantivesse a calma, enquanto ele, possivelmente irritado, responderia: “Calma? Mas o Filho do Homem vai morrer porque eu O traí!” Então, com um sorriso no rosto e lágrimas nos olhos, eu lhe diria: “Sim, Ele vai. Mas fique calmo, porque se você esperar três dias, o mesmo sangue que você traiu vai te salvar. O mesmo sangue para o qual você virou as costas vai te alcançar, perdoar e dar uma oportunidade para viver algo novo.[6]

Essa declaração é simplesmente surreal, meus irmãos! Eu também poderia apresentar aqui os devaneios da terceira pessoa da maligna trindade da Teologia do Coaching, Victor Azevedo. Porém, creio que esses exemplos são suficientes para percebermos que tudo o que pode ser encontrado nessa teologia é uma mistura entre humanismo e materialismo. O indivíduo, o ser humano é o centro de tudo nessa teologia. Não há anúncio da cruz de Cristo como a solução para a rebeldia e a malignidade do ser humano. Não há pregação acerca da porta estreita e do caminho estreito. Não há chamado à renúncia, a sofrer afrontas por causa do nome de Jesus Cristo. Tudo o que há é motivacionismo travestido de fé.

Em uma “pregação” também bastante conhecida nas mídias sociais, Deive Leonardo diz: “Do coração de Deus, Jesus é o centro. Mas do coração de Jesus, você é o centro […] Você é a pessoa mais importante da face da terra […] Todo amor é por conta de você. O sacrifício é por sua culpa. A cruz é por conta de você. O sangue é por conta de você. O amor é por conta de você. Você é a pessoa mais importante da face da terra”. Irmãos, quem não gosta de ouvir esse tipo de afirmação? Ela anima, contagia, não é mesmo? Ouvir que a cruz de Cristo é a prova do quanto somos importantes para Deus é algo extremamente agradável, mas não é o evangelho. Eu gosto muito da afirmação feita por Don Matzat, um pastor luterano em Saint Louis, nos Estados Unidos:

Um recente programa de televisão reportou a acareação de um assassino que admitiu a responsabilidade por pelo menos quinze assassinatos. O juiz firmou sua fiança em cinco milhões de dólares[7]! Será que usaríamos o mesmo tipo de raciocínio para concluir que esse homem deveria se sentir bem acerca de si mesmo considerando-se como um ser humano de especial valor, uma vez que o juiz firmou sua fiança em valor tão alto? Afinal, ele vale cinco milhões de dólares para a sociedade!

A fiança de $5 milhões obviamente não reflete o valor do assassino, mas a severidade do seu crime. Igualmente, a morte de nosso Senhor Jesus Cristo na cruz não é uma declaração de nosso valor, mas indica a profundidade do nosso pecado e culpa diante de Deus. Repetindo, se Jesus morreu por nós porque ele viu algo em nós pelo que valia morrer, então havia algo em nós que merecesse sua morte. Mas nós somos salvos por algo bom em Deus, não porque haja algo bom em nós.[8]

A cruz de Cristo, meus irmãos, denuncia, em primeiro lugar, a nossa maldade, a nossa vileza, a nossa malignidade, a nossa rebeldia. Quando mencionou a cruz de Cristo pela primeira vez na sua epístola à igreja de Roma, o apóstolo Paulo apontou a justiça de Deus como o motivo: Mas agora, sem lei, se manifestou a justiça de Deus testemunhada pela lei e pelos profetas; justiça de Deus mediante a fé em Jesus Cristo, para todos e sobre todos os que creem; porque não há distinção, pois todos pecaram e carecem da glória de Deus, sendo justificados gratuitamente, por sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus, a quem Deus propôs, no seu sangue, como propiciação, mediante a fé, para manifestar a sua justiça, por ter Deus, na sua tolerância, deixado impunes os pecados anteriormente cometidos” (Romanos 3.21-25). Apenas no capítulo 5.8, é que Paulo vai mencionar o amor de Deus como a outra motivação para a cruz de Cristo. Mas, percebam, meus irmãos, mesmo o amor de Deus é imerecido, não se baseando em qualquer bondade nossa, mas, na verdade, se manifestando graciosamente a despeito da nossa malignidade.

Os pastores Joel R. Beeke e Paul M. Smalley mostram exatamente o que está por detrás de teologias antropocêntricas como a Teologia do Coaching:

Às vezes, o teísmo finito aparece nas crenças informais de uma cultura. Na cultura americana, isso geralmente aparece na forma de um deus da simpatia. Um exemplo recente é o fenômeno que alguns sociólogos chamam de “deísmo moralista terapêutico”. Essa teologia popular pode ser resumida nas palavras “Deus é como alguém que está sempre presente para você”. A justiça e a lei de Deus são reduzidas a “Seja bom, agradável e justo um com o outro”. Sua onipresença se torna suporte emocional, mas sua majestade permanece a uma distância segura. Sua glória deixa de ser o objetivo de todas as coisas e o verdadeiro norte da bússola moral. O principal objetivo do homem é “sentir-se bem consigo mesmo” (portanto, essa visão é chamada de “terapêutica”).[9]

Se pudéssemos falar de um Catecismo Maior do Deísmo Moralista Terapêutico, de autoria de Tiago Brunet, Deive Leonardo, Victor Azevedo e outros 118 satânicos teólogos coaches, a primeira pergunta, certamente, seria: “Pergunta 1. Qual a o fim principal de Deus? Resposta: Fazer-me feliz e me dar tudo o que eu quero”.

Mas o que é, então, o Deísmo Moralista Terapêutico?

2.3. O deísmo moralista terapêutico

Irmãos, essa expressão “Deísmo Moralista Terapêutico” foi cunhada por um sociólogo americano chamado Christian Smith, em um livro publicado em coautoria, no ano de 2006, intitulado Soul Searching: The Religious and Spiritual Lives of American Teenagers. Ele define o Deísmo Moralista Terapêutico como um credo que possui as seguintes premissas:

1. Um Deus que existe criou e ordena o mundo, além de cuidar da vida humana na terra.

2. Deus quer que as pessoas sejam boas, legais e justas umas para com as outras, como ensinado na Bíblia e pela maioria das religiões mundiais.

3. O objetivo central da vida é ser feliz e se sentir bem consigo mesmo.

4. Deus não precisa estar particularmente envolvido na vida de alguém, exceto quando Deus precisa resolver um problema.

5. Pessoas boas vão para o céu quando morrem.[10]

É exatamente esse tipo de pensamento que permeia não apenas a Teologia do Coaching, mas todas as teologias antropocêntricas que conhecemos e que estão por aí, encontrando abrigo em nossas igrejas evangélicas.

O conceito de Deísmo Moralista Terapêutico tem sido amplamente usado por teólogos reformados, a fim de diagnosticar a real situação do nosso evangelicalismo. O Dr. Michael Horton, em sua excelente obra Cristianismo sem Cristo, afirma que se trata de uma espécie de cativeiro no qual a igreja americana se encontra presa hoje em dia. De acordo com ele: “Basicamente, a mensagem é que Deus é bom e nós somos bons, por isso devemos todos ser bons”.[11] Além disso, ele cita um estudioso americano chamado George Barna, que após conduzir uma pesquisa entre os evangélicos americanos, concluiu que

“para um crescente número de americanos, Deus – caso pelo menos se acredite em uma divindade sobrenatural – existe para o prazer da humanidade Ele reside no reino celestial exclusivamente para proveito e benefício nosso. Embora sejamos espertos demais para confessar isso em voz alta, vivemos pela noção de que o verdadeiro poder não é acessado olhando para cima, mas nos voltando para dentro de nós”.[12]

Michael Horton menciona também que há mais de uma década teve a oportunidade de entrevistar Robert Schuller, um controverso pastor americano, adepto da Teologia da Confissão Positiva. Durante a entrevista, Schuller teria dito que uma igreja “pode se dar ao luxo de pensar em um Deus como o centro, mas uma missão precisa colocar os seres humanos no centro”. Não apenas isso, mas de acordo com Schuller, “‘a teologia clássica cometeu um erro em sua insistência na teologia centrada em Deus, e não centrada no homem’”.[13] Há, nessas afirmações, alguma semelhança com aquilo que presenciamos em nosso país, através da Teologia do Coaching? A semelhança é assustadora.

Michael Horton inicia o seu livro com uma pergunta bem interessante: “Como seriam as coisas se Satanás assumisse por completo o controle de uma cidade?” Então, ele apresenta o cenário imaginado por outro pastor americano chamado Donald Grey Barnhouse, que foi pastor na histórica Décima Igreja Presbiteriana da Filadélfia:

Barnhouse especulou que, se Satanás assumisse o controle da Filadélfia, todos os bares seriam fechados, a pornografia seria banida e as ruas imaculadas ficariam cheias de pedestres bem-arrumados que sorririam uns para os outros. Não haveria xingamentos. As crianças diriam “sim, senhor” e “não, senhora”, e as igrejas estariam cheias todos os domingos… Onde Cristo não seria pregado.[14]

Os bares não estão fechados, a pornografia anda solta, há xingamentos no mundo, as crianças de hoje são mal-educadas, mas, meus irmãos, inegavelmente, muitas igrejas estão abarrotadas de pessoas aos domingos para ouvir pregadores que não pregam uma palavra sequer do evangelho de Cristo. Cristo não está sendo pregado através dos adeptos da Teologia do Coaching. A menção que esses homens fazem ao nome de Cristo em suas palestras motivacionais nada mais é do que apenas quebra, uma flagrante e maligna quebra do terceiro mandamento. Eles tomam o santo nome de nosso Senhor Jesus em vão. Eles mentem em nome de Jesus. Inegavelmente, o cristianismo da Teologia do Coaching é um “cristianismo sem Cristo”.

3. Conclusão

Eu gostaria de concluir nesta ocasião, apenas chamando a atenção de vocês para o fato de que, sim, é verdade que Deus nos criou para sermos felizes. Mas jamais encontraremos a felicidade dentro de nós mesmos. O potencial inerente que há em nosso coração é apenas o potencial para o pecado. Há um grande vazio dentro do coração do ser humano, que jamais será preenchido pelas coisas deste mundo ou através do desenvolvimento das potencialidades do indivíduo. Enquanto o homem estiver centrado em si mesmo, ele será apenas entorpecido por uma mensagem que, no final das contas, terá contribuído para a sua danação eterna. Essa mensagem pregada pela Teologia do Coaching não pastoreia vidas e corações. Ela apenas proporciona boas emoções e entretenimento para bodes. Para mim, é sintomático que pessoas como Anitta, Nego do Boréu, Ludmilla, e muitas outras pessoas que estão arruinadas em seus pecados e apenas contribuem para a deterioração da nossa cultura, sejam exatamente aquelas que comentam as postagens de homens como Tiago Brunet e Deive Leonardo, dizendo coisas como “É forte!”, “Recebo!”, “Bênção, irmão!”. São pessoas que permanecem em suas promiscuidades, sem arrependimento, sem temor a Deus, sem submissão à Palavra de Deus.

A felicidade que Deus tenciona para nós só pode ser encontrada nele, numa vida de submissão à sua Palavra, de renúncia ao nosso ego, de arrependimento pelos nossos pecados e reconhecimento da nossa maldade, de fé e confiança no sacrifício de Cristo, pelo qual somos perdoados da nossa culpa e temos comunhão com Deus. A verdadeira felicidade está em viver não para o desenvolvimento infinito de nossas potencialidades, mas em gastarmos todo o nosso ser para o serviço de Deus e vivermos para a glória do seu nome, para que os homens vejam as nossas boas obras, e glorifiquem ao nosso Pai que está nos céus (Mateus 5.16).

Foi isso que o salmista Asafe entendeu, no Salmo 73. Como Deus começa a nos fazer verdadeiramente felizes aqui, nesta vida? Ele se torna nosso, como foi afirmado pelo salmista Asafe: “Deus é a fortaleza do meu coração e a minha herança para sempre” (Salmo 73.26b). Enquanto Asafe buscou a felicidade nas coisas exteriores, naquilo que os ímpios possuíam, ele experimentou a infelicidade. Foi quando se tocou que ele tinha a maior de todas as riquezas, o próprio Deus com ele, que ele encontrou a verdadeira felicidade. Permitam-me também compartilhar com vocês o que outro servo de Deus do passado, um pastor chamado George Swinnock afirmou sobre essa declaração do salmista Asafe:

Deus é todas as boas coisas e cada coisa boa. Ele é autossuficiente, somente suficiente e todo suficiente. Nada falta nele – seja para a proteção da alma de todo mal, seja para a perfeição da alma com todo bem. Se Deus fosse a sua porção, você encontraria nele qualquer coisa que o seu coração desejasse e qualquer coisa que pudesse levar você à felicidade. Você é ambicioso? Deus é uma coroa de glória. Você é cobiçoso? Deus é riquezas insondáveis. Você é lascivo? Deus é rios de prazer e plenitude de alegria. Você está com fome? Deus é um banquete. Você está cansado? Deus é repouso – uma sombra para o calor e um abrigo para a tempestade. Você está fraco? Deus é força eterna. Você está em dúvida? Deus é maravilhoso em conselho. Você está nas trevas? Deus é o sol de justiça, uma luz eterna. Você está doente? Ele é o Deus da sua saúde. Você está triste? Ele é o Deus de todo conforto. Você está morrendo? Ele é a fonte de vida. Você está em angústia? Seu nome é torre forte, para onde você pode correr e encontrar segurança. Ele é um remédio universal contra toda sorte de miséria. Qualquer que seja a sua calamidade, ele pode removê-la. Qualquer que seja a sua necessidade, ele pode aliviá-la. Ele é prata, ouro, honra, deleite, alimento, vestimenta, lar, terra, paz, sabedoria, poder, beleza, pai, mãe, esposa, marido, misericórdia, amor, graça, glória e infinitamente mais do que tudo isso.[15]

Que o Senhor, pois, nos abençoe e nos guarde da nefasta Teologia do Coaching! Amém!
__________________________

[1] Disponível em: <https://www.ibccoaching.com.br/portal/coaching/o-que-e-coaching/>.

[2] Disponível em: <https://www.jrmcoaching.com.br/blog/o-que-e-linguagem-ericksoniana/>.

[3] Deive Leonardo. O Amor Mais Louco da História. São Paulo: Quatro Ventos, 2018. p. 23.

[4] Ibid. p. 24.

[5] Thayer’s Greek Lexicon in BibleWorks 10.

[6] Deive Leonardo. O Amor Mais Louco da História. p. 35-36.

[7] Conforme o original em inglês.

[8] Don Matzat. “Um Caminho Melhor: Cristo é Meu Valor”. In: Michael Horton (Org.). Religião de Poder. São Paulo: Cultura Cristã, 1998. p. 209.

[9] Joel R. Beeke e Paul M. Smalley. Reformed Systematic Theology. Wheaton, IL: Crossway, 2019. p. 598.

[10] Christian Smith e Melinda Lunquist Denton. Soul Searching: The Religious and Spiritual Lives of American Teenagers. Nova York: Oxford University Press, 2006. p. 162-163.

[11] Michael Horton. Cristianismo sem Cristo: O Evangelho Alternativo da Igreja Atual. São Paulo: Cultura Cristã, 2010. p. 36.

[12] Ibid. p. 26.

[13] Ibid. p. 28.

[14] Ibid. p. 13.

[15] George Swinnock. The Fading of Flesh and the Flourishing of Faith. Grand Rapids, MI: Reformation Heritage Books, 2009. pp. 153-154.

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