Felizmente o Brasil perdeu a Copa do Mundo

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Com o fim da anestesia da Copa

Com certeza o título deste artigo poderá provocar, num primeiro momento, a ira de algum leitor, mas sugiro que o leia até o fim e tire as suas próprias conclusões.

O que temos visto nas últimas semanas, no momento dos jogos do Brasil, tem sido inusitado – um país em crise que pára para ver um time de jogadores milionários atuar de modo sofrível e ir até as oitavas-de-final da Copa do Mundo. O prejuízo já tem sido contabilizado pelo comércio, e até o mercado de livros no primeiro semestre sofreu queda na produção e vendas (com desemprego inclusive), pois os leitores acabaram investindo seus recursos em atualizar o seu televisor por um de plasma ou LCD.

Talvez você possa estar pensando que sou um estraga-prazeres que nem dá chance para o povo ter um momento de lazer. Nada disso. Penso que temos o direito de ter momentos de descontração e lazer. Uma coisa é o lazer, outra é a anestesiação em que o povo parecia estar mergulhado, esquecendo da grave crise da nação. O país estava parando enquanto precisava andar. Já me disseram que temos memória curta – tenho a impressão de que só temos uma vaga lembrança das mazelas do país. Parece-me que já esquecemos do mensalão , pois agora temos sanguessuga e nem sabemos o que vem pela frente.

A lição da anestesiação do futebol parece-me que indica o hábito de que temos de adiar a busca de soluções para os dilemas que temos enfrentado como povo e nação. Você se lembra quando instituíram a CPMF, em que a letra P da abreviatura indicava “Provisória”, e agora parece que indica “Permanente”? Ou a imprensa não dá conta de tanta falcatrua e na primeira página dos jornais já não cabem as novidades, ou então está comprometida, pois com facilidade as notícias vão sendo esquecidas, sublimadas, substituídas por outras novidades.

Perdendo a Copa, o brasileiro agora tem espaço em sua mente para pensar na vida concreta e ver que as eleições estão chegando, que precisará tomar decisões difíceis na escolha de seus candidatos, que agora é a hora de rever o que está sendo feito, ou melhor, o que está sendo deixado de fazer para que o país tome novo rumo. Agora é hora de acordar dos efeitos soníferos da ilusão da Copa e considerar uma revisão de nossa vida pessoal, de nossas prioridades, de como poderemos deixar positivamente nossa marca na história daqueles que nos cercam.

Enquanto jogadores de futebol ganham uma fortuna, temos que pagar uma fortuna em impostos para sobreviver. A distribuição de renda no país ainda é bem sofrível, e nenhum plano efetivo tem conseguido dar conta do dilema – nem os planos eleitoreiros (assim chamados por jornalistas e políticos da oposição) do atual governo. Não há mais lugar para bravatas e discursos vazios. É preciso governos que coloquem a casa em ordem em vez de oportunizar benesses a amigos e afilhados. E nem falamos em educação, segurança, transportes, estradas, saúde, aposentadoria. Aliás, aqui em nosso país aposentadoria parece piada, e com raras exceções, hospital público muitas vezes parece açougue.

Enquanto isso, nós, evangélicos, precisamos também acordar de nosso sono escatológico e salvacionista que nos tem levado a pregar e viver um Evangelho estratosférico, que apenas visualiza as ruas de ouro dos céus, mas que muitas vezes acaba nos levando a viver um evangelho descompromissado e irresponsável, como consumidores da realidade.

O Brasil perdeu a Copa e nós poderemos perder a grande chance de participar concretamente na construção da realidade diária, exercendo uma cidadania responsável e exemplar. Veja à sua volta como você pode participar para um ambiente melhor e mãos à obra, pois os jogadores da seleção não conseguiram dar conta do recado.

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