A espiritualidade dos servos de Deus

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FERREIRA, Franklin. Servos de Deus: espiritualidade e teologia na história da igreja. 1ed. São José dos Campos: Editora Fiel, 2015. 474p.

Franklin Ferreira é bacharel em Teologia pela Universidade Mackenzie e mestre em Teologia pelo Seminário Batista do Sul (RJ). Diretor do Seminário Martin Bucer e consultor acadêmico de Edições Vida Nova, Franklin é coautor do livro “Teologia Sistemática” e autor dos livros “O Credo dos Apóstolos” (Fiel) e “A Igreja Cristã na História” (Vida Nova).

Escrever uma biografia não é tarefa fácil, pois trata-se de examinar uma vida e condensar em poucas páginas aquilo que merece ser apresentado para os interessados no personagem. Em se tratando de pessoa ainda viva ou que tenha morrido há pouco tempo, a maior dificuldade talvez seja selecionar as informações relevantes dentre as muitas existentes, mas se o biografado viveu séculos atrás, numa época que nem imprensa existia, a tarefa é ainda mais desafiadora. Disso se pode obter uma ideia do tempo e esforço necessários para escrever sobre a vida e a teologia de 32 vultos vividos ao longo 2000 anos de história da igreja. Este é o trabalho empreendido por Franklin Ferreira e o livro Servos de Deus é o resultado do empreendimento.

A obra está dividida em 32 capítulos, dedicados um a cada personagem da fé cristã, precedidos de uma breve introdução à espiritualidade cristã e terminando com uma aplicação prática a título de conclusão. Os capítulos são independentes, podendo ser lidos em qualquer sequência, mas o arranjo cronológico sugere melhor proveito. Ao final de cada capítulo o autor relaciona as obras consultadas e recomenda outras para aprofundamento na vida, obra e ensinos da pessoa destacada. Ao final, uma breve bibliografia geral é fornecida.

Como o título indica, o autor explora a espiritualidade e a doutrina dos religiosos estudados, porém fatos circunstanciais da vida deles são apresentados, o que fornece um pano de fundo para melhor compreensão, e até mesmo concessões, de ensinos que hoje rejeitamos, mas que foram defendidos por alguns dos biografados. Portanto, não se trata de uma obra que simplesmente informa onde e quando nasceu e morreu (embora isso seja feito) ou meramente associa doutrinas a pessoas. Franklin é, por assim dizer, simpático aos personagens, aproximando-se deles e descrevendo suas aventuras e desventuras num tom bastante pessoal, aproximando o leitor dos fatos ocorridos e dos crentes envolvidos.

Além disso, outras características da obra podem ser mencionadas. Por se tratar de um trabalho abrangente, em termos de quantidade de pessoas estudadas e extensão do período da história considerado, seria de se esperar que o tratamento seja superficial ou curto. Mas o autor foi bem-sucedido em equilibrar objetividade e detalhamento. Obviamente, tal detalhamento não significa aprofundamento, mas os detalhes são, em muitos casos, inesperados e em todos os casos, apropriados ao propósito da obra.

Chama atenção o espectro teológico das pessoas selecionadas para constar na obra. Há católicos romanos, luteranos, anglicanos, puritanos, presbiterianos, batistas, congregacionais, metodistas, calvinistas e arminianos. Certamente alguns ficarão surpresos com a presença de Bento de Núrsia e outros com Barth, além de Blaise Pascal e José Manoel da Costa (um dos que pessoalmente mais me impressionou). E mesmo com tantos biografados, alguém reclamará pela falta de outros.

Apesar dessa diversidade, o autor passa ao largo de questões controversas e mesmo deixando transparecer sua posição doutrinária e criticando posições problemáticas dos personagens, o faz sem polemizar, sempre destacando aspectos positivos e lições proveitosas a serem extraídas dos mesmos. Arminianos e calvinistas que lerem a obra em busca de críticas a teologia de Calvino ou de Wesley encontrarão muito pouco material para se satisfazer.

Porém, não se deve pensar que a obra faz concessões doutrinárias em nome da comunhão. O autor não poupa críticas à igreja moderna e enfatiza que a base da unidade é a confessionalidade. O critério adotado é o consenso cristão nas doutrinas fundamentais e não em aspectos denominacionais.

O autor optou por não usar notas de rodapé para referenciar as abundantes citações feitas ao longo da obra, embora mencione o nome dos autores. Por um lado, isso tornou a leitura mais dinâmica, sem aspecto acadêmico e talvez mais adequado à referência à espiritualidade do subtítulo. Mas por outro, aos interessados em verificar a fonte da citação isto ficou dificultado. Considerando que as citações em geral não são polêmicas, a falta de notas de rodapé não compromete a confiabilidade das citações, porém pelo menos as citações diretas poderiam ser referenciadas.

A obra foi bem revisada e poucos erros podem ser identificados. Como exemplo pode ser citado o registro de que Spurgeon morreu em 30 de janeiro e foi enterrado em 4 de janeiro de 1892. Obviamente a intenção era escrever 4 de fevereiro (embora outras fontes indiquem que o sepultamento ocorreu mesmo em 11 de fevereiro).

O livro resulta recomendável para quem se interessa por biografias inspiradoras, pelo desenvolvimento histórico da espiritualidade cristã ou pelos contextos em que as posições teológicas surgiram e se consolidaram.

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