Teísmo aberto

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A teologia de um Deus limitado

As influências da teologia denominada como teísmo aberto já tem sorrateiramente penetrado nas igrejas brasileiras. Uma conhecida líder evangélica, de grande prestígio nacional, bastante conhecida por sua ênfase na prática da oração e do jejum, passou a apoiar publicamente a candidata Marina Silva para a presidência da república.

Numa mensagem enviada por e-mail, ela disse que “[..] No início da campanha conversei com o Pai, perguntando-lhe: ‘Não existe a menor possibilidade de Marina vencer, já em 2010?’ Recebi uma palavra em três ocasiões: ‘Possibilidade existe. Mas depende de duas coisas: Muito jejum e oração e muito trabalho’” (grifo da autora). Independentemente de se crer que o dom de profecia é uma manifestação do Espírito Santo para os dias atuais, o que chama a atenção neste caso é: (1) O Senhor não é o autor e condutor soberano da História; (2) O futuro é condicionado apenas pelas ações (ou omissões) do ser humano no presente. Pois bem, este tipo de revelação expressa claramente a teologia do teísmo aberto que Bruce Ware tratou em seu livro.

Bruce Ware obteve o seu M.Div. e Th.M no Western Seminary, o M.A. no Washington University e o Ph.D no Fuller Theological Seminary. Foi professor no renomado Trinity Evangelical Divinity School e atualmente é reitor adjunto e professor de Teologia Cristã no Southern Baptist Theological Seminary. Ware é um especialista sobre o teísmo aberto e tem escrito diversos artigos sobre o assunto em periódicos especializados.

Ware cita alguns dos defensores do teísmo aberto (John Sanders, Gregory A. Boyd e Clark Pinnock) e explica que: 

Esse movimento é assim denominado pelo fato de seus adeptos verem grande parte do futuro como algo que está em “aberto”, e não fechado, mesmo para Deus. Boa parte do futuro ainda está indefinida e, consequentemente, Deus o desconhece. Deus conhece tudo o que pode ser conhecido, asseguram-nos os teístas abertos. Mas livres escolhas e ações futuras, por não terem ocorrido ainda, não existem e, desse modo, Deus (até mesmo Deus) não pode conhecê-las (p. 14-15).  

O livro é dividido em cinco capítulos e no primeiro, o autor lista três razões pelas quais os teístas abertos creem nessa teologia: (1) O relacionamento entre o crente e o Senhor será mais autêntico e real, se o Senhor não souber do futuro dele; (2) A sua visão sobre o sofrimento humano pretende ser mais confortadora do que a da teologia tradicional; (3) A sua teologia almeja explicar melhor o ensino das escrituras sobre Deus (p. 15-18).

No segundo capítulo, Ware expõe os principais argumentos bíblicos que os teístas abertos usam para fundamentar a sua teologia sobre a presciência divina (a reação do Senhor ao sacrifício de Isaque, o Dilúvio e a rejeição de Isaú). Segundo Ware,  

[…] parece claro aos defensores do teísmo aberto que Deus aprende a partir do que acontece. Em parte, nas Escrituras, isso é demonstrado pelas ocasiões em que Deus se arrepende do que fez e reavalia ou muda sua opinião (p. 32). 

Mais adiante, o autor usa algumas passagens bíblicas (Is 46.8-11; Ex 3.19-20; Sl 139; Dn 11; Jo 13.19 e 38; 18.4) para refutar esses argumentos defendidos pelos teístas abertos. Para Ware: “O fato de que Deus é Deus precisamente (em parte) porque anuncia o que acontecerá e, quando o que foi anunciado acontece, as Escrituras chamam nossa atenção para o fato de que tudo se realizou conforme Deus dissera” (p. 51, grifo do autor).

No terceiro capítulo, Ware discorre a visão do teísmo aberto acerca do sofrimento humano, que entende que a dor e o sofrimento que sobrevém ao ser humano é algo fruto de suas más escolhas e ações erradas, apenas, e trata-se de um evento futuro no qual Deus não sabe com antecedência que ocorrerá. Para os teístas abertos, “Deus não sabe de antemão que a aflição sobrevirá nem deseja que ela ocorra. Quando ela acontece, o sofrimento e a dor não servem a nenhum propósito divino […]” (p. 75). Ware, então, neste capítulo, contra argumenta e expõe o ensino bíblico sobre o sofrimento humano. Ele diz: “[…] o sofrimento com frequência é ordenado por Deus e intencionalmente usado por Ele como um bem instrumental” (p. 79).

No quarto capítulo, o autor aborda a teologia da oração, conforme é defendida pelos teístas abertos. Ware faz uma citação de Gregory Boyd (um teísta aberto) sobre a oração:

Visto que Deus quer que tenhamos autonomia, visto que ele deseja que nos comuniquemos com ele e aprendamos que somos dependentes dele, Deus graciosamente nos concede a habilidade de afetá-lo significativamente. […] Assim como um pai ou esposo amoroso, ele deseja não apenas influenciar-nos mas também ser influenciado por nós. (p. 100, grifo do autor). 

Depois de expor o ensino bíblico sobre a oração, refutando os erros do teísmo aberto, Ware comenta que:

Devo sugerir que tal noção [acerca da oração] funciona bem hoje em dia, por causa da cultura do psicologismo da qual a igreja cristã está saturada. Quando a autoestima é a norma no sistema educacional, as crianças, inclusive as de pais cristãos, crescem com excessivo apreço por sua própria importância. Nós as estimulamos a “decidir por si mesmas” […], e nos é dito para não corrigi-las ou dizer-lhes que estão erradas, mas sempre e apenas aplaudir seus esforços. Assim sendo, quando os teístas abertos aparecem dizendo; “Deus respeita muito você e seu livre arbítrio para simplesmente decidir o rumo de sua vida sem sua participação; ele espera escutar o que você deseja, antes de tomar suas decisões […]”. (p. 114).

Ware conclui seus argumentos dizendo que “[…] o teísmo aberto adota um conceito de Deus que o rebaixa a nosso nível. A menos que Deus se relacione conosco da mesma forma que nos relacionamos uns com os outros, não há relacionamento real, segundo dizem os teístas abertos” (p. 116, grifo do autor).

No quinto capítulo, Bruce Ware disserta qual é a mensagem de esperança do teísmo aberto para o crente. Ele usa então o Salmo 62, Romanos 4.18-21 e 1 Pedro 1.3-9 para extrair o ensino bíblico sobre este tema e chama a atenção do leitor para que compare as duas mensagens de esperança.

Por fim, Ware faz na última parte de seu livro, um resumo e recapitulação de tudo o que foi tratado ao longo dos capítulos anteriores e alerta a igreja para os perigos de se afastar dos ensinos bíblicos sobre Deus, com uma citação de A. W. Tozer: “[…] A essência da idolatria é o acolhimento de pensamentos acerca de Deus que são indignos dele. […] O primeiro passo para a queda de qualquer igreja ocorre quando esta renuncia à sua elevada visão de Deus” (p. 142).

Teísmo aberto: a teologia de um Deus limitado é uma obra de leitura agradável, com relativa profundidade teológica e que expõe de modo imparcial as linhas mestras do teísmo aberto. Este livro é importante porque trata de temas (relacionamento com Deus, a soberania e a presciência divina, a esperança e o sofrimento do crente) que estão sendo explorados no mercado editorial evangélico, mas fortemente influenciado pelos valores da pós-modernidade (humanismo, vitórias, conquistas, comodidade, etc.) e que tem contribuído para fomentação de mentalidade e de atitude estranhas ao NT.

Recomendo sem reservas esta preciosidade teológica e que possui consequências práticas na vida cristã do verdadeiro discípulo de Jesus, que não anda procurando pregadores e pastores que proclamam verdadeiras ilusões, por mais que pareçam agradáveis ao mundo atual.

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BIBLIOGRAFIA

WARE, Bruce A. Teísmo aberto: a teologia de um Deus limitado. São Paulo: Vida Nova, 2010. 144 p.

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