O púlpito saudável

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É de fundamental importância compreender o que vem a ser um púlpito saudável, uma vez que os conceitos de retidão e de consolidação de parâmetros têm sido desestruturados sistematicamente nestes últimos tempos da história humana, em especial, para nossa leitura, a partir de meados do século XIX. As camadas mais recentes da população mundial têm se lançado de modo categórico na busca por verdades que não sejam propriamente verdades, mas conceitos representativos que predominem por determinadas faixas de tempo e cultura, sem que necessariamente se mostrem da mesma forma em outros tempos ou culturas. Com particular atenção isso é levado a termo por pensadores e formadores de opinião, os quais assumem a missão de ser os atalaias de pensamentos ortodoxamente não ortodoxos, expondo as mais profundas incongruências como se fossem verdades absolutas, nem que seja apenas por um certo período de tempo.

Quando nos voltamos para a Igreja de Cristo, o que percebemos é que um afastamento constante dos axiomas bíblicos tem sido o caminho natural para aproximar seus pensadores e fieis do mundo que os cerca. A esperança dessas vertentes é tornar a Igreja mais palatável e mais próxima ao mundo secular, sem perceberem, no entanto, que isso desfigura a Igreja, já que o seu centro, que é Cristo, não comunga com princípios etéreos de relativismos e de falta de condução coerente. O vértice do cristianismo é um conjunto de princípios espirituais que não dependem do mundo exterior aos seus postulados – embora com notados reflexos na prática de vida –, mas precisa se manter firme a fim de preservar o seu legado. Dessa forma, os desvios da centralidade bíblica do púlpito cristão e todas as concessões feitas em nome da boa vizinhança com o meio secular, têm afetado e degenerado as comunidades com reflexos diretos e profundamente danosos aos fieis que se reúnem nas diversas igrejas cristãs locais.

O púlpito saudável, assim como ocorre conosco, tem algumas características. Poderiam ser muitas as mencionadas, mas estou certo que umas poucas, porém fundamentais, nos trazem à mente as ocorrências que nos interessam para este trabalho. Edgar Andrews começa seu livro com uma pergunta, que é o título do Capítulo 1: “O que vamos pregar?” , que me parece ser de fundamental importância para a compreensão do que venha a ser um púlpito sadio. A Igreja do Senhor Jesus foi conclamada e comissionada a pregar o próprio Jesus Cristo, mostrando ao mundo que não há outra maneira de aproximar um pecador e torná-lo filho de Deus que não através dele. Quando a Igreja se afasta dessa comissão fundamental, ela perde a sua mais essencial característica, perde o cerne de sua existência. O afastamento da pregação de Cristo não representa que não se fale mais em Seu nome, mas representa que o Seu nome não seja mais adequadamente ensinado, tornando a pessoa de Jesus apenas mais um ícone na busca humana por sua espiritualidade. Todos os cristãos concordam que Cristo realmente precisa ser pregado, mas nem todos os que transitam pelas igrejas locais conseguem ver que a pregação não se resume a fazer menção ao nome ou a traçar paralelos da biografia de Jesus. Antes, o que precisamos ter em mente que a pregação precisa responder à pergunta de Andrews com uma resposta simples e direta, conforme os atos da igreja em seu início: “E todos os dias, no templo e de casa em casa, não cessavam de ensinar e de pregar Jesus, o Cristo.” 2

Somente uma igreja que tenha o seu púlpito sadio, pregando Jesus Cristo, poderá também propagar os benefícios eternos e temporais do encontro com Ele. Pregar Cristo representa estar habilitado a pregar as boas novas da salvação, pois não há salvação em nenhum outro que não Ele3 . Isso representa dizer que o púlpito saudável não abre exceções quanto ao senhorio de Cristo nem quanto à possibilidade de salvação através de quaisquer outros meios, o que torna a pregação a respeito de Cristo totalmente ímpar. As boas novas existem, e somente há um meio pelo qual a resultante das boas novas se estabelece no coração do homem, que é através da obra de Cristo. Um púlpito saudável ressalta essa verdade.

A salvação tem relação direta com a libertação, uma vez que é o agrilhoamento espiritual, proveniente da morte na qual nos encontramos como seres naturais, que nos impede de chegar ao Pai Celeste. Quando Jesus leu o livro do profeta Isaías, assumiu para si mesmo as palavras ali contidas, nas quais se afirma que Ele veio “proclamar libertação aos cativos” e “pôr em liberdade os oprimidos” 4 . Quando um púlpito abandona a pregação de Cristo, ele abandona também a capacidade de levar libertação às pessoas que se encontram em estado espiritual deplorável, subjugadas pelo pecado, marcadas para uma eternidade afastada de Deus e de Sua glória. Isso porque um púlpito, para ser saudável, é preciso lhes dizer que, além de receber as boas novas propagadas, estas precisam surtir efeito de libertação nas vidas que têm acesso à verdade do Evangelho e à mensagem da salvação. A resultante desse processo é o arrependimento que leva à salvação. O coração contrito diante da revelação do seu estado pecaminoso e de sua situação espiritual é liberto pelo poder de Cristo Jesus e, por isso, chega ao arrependimento. Edward diz que “Arrependimento é ‘mudança da mente’ e ‘mudança de propósitos’ (são empregadas duas palavras gregas diferentes). Não é apenas ter tristeza pelo pecado, mas abandonar o pecado como um modo de vida” 5.

Há enorme perigo se não pregarmos Cristo como centro de nossa pregação, uma vez que, se Ele não é pregado como deveria, algo ou alguém preencherá a lacuna deixada por nossa omissão. Michael F. Ross cita em sua obra o texto de 1 Coríntios 2.26, asseverando que nesse caso um vácuo é criado. Diz ele: “Quando Cristo não é pregado (1 Coríntios 2.2) então se cria um vácuo; as pessoas precisam se agarrar a algum outro líder, algum campeão, algum ‘homem santo’ que não seja Cristo” 7 . No início desse mesmo capítulo, de número 6, o autor identifica essa relação com a perda do “primeiro amor” referenciado em Apocalipse 2.1-78  e que, segundo Ross, é claro sintoma de comunidade que está carente de revitalização, colocando-a como igreja enferma ou moribunda.

Fazendo uma analogia bastante livre, a pregação pode ser comparada ao maná que Deus enviava diariamente ao povo de Deus, alimento que o sustentou ao longo de toda sua travessia do deserto, no êxodo em direção a Canaã. O maná era diário, com a exceção do sábado, cuja ração era recebida de véspera e guardada. No entanto, o mesmo maná que alimentava o povo, se colhido e guardado de maneira diferente das orientações de Deus, viria a se estragar, invalidando sua composição e a destinação que tinha, que era prover alimento saudável ao povo de Deus. A pregação da palavra de Deus precisa partir do mesmo princípio: a Bíblia pode ser utilizada de maneira errônea, diferente das orientações de Deus, o que vai trazer alimento insatisfatório ao povo de Deus que está sob os cuidados daquele púlpito. O afastamento da centralidade de Cristo no púlpito gera a perda da identidade e o desfalecimento espiritual, enquanto estamos certos que o retorno a essa mesma centralidade gerará a propagação das boas novas, a libertação e o arrependimento que conduzem o coração do homem à salvação.

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 1 ANDREWS, E. (2006). Pregando Cristo. (O. Olivetti, Trad.) São Paulo, SP, Brasil: PES.
 2 Atos 5.42: “E todos os dias, no templo e de casa em casa, não cessavam de ensinar e de pregar Jesus, o Cristo.”
 3 Atos 4.12: “E não há salvação em nenhum outro; porque abaixo do céu não existe nenhum outro nome, dado entre os homens, pelo qual importa que sejamos salvos.”
 4 Lucas 4.18,19: “O Espírito do Senhor está sobre mim, pelo que me ungiu para evangelizar os pobres; enviou-me para proclamar libertação aos cativos e restauração da vista aos cegos, para pôr em liberdade os oprimidos, e apregoar o ano aceitável do Senhor.”
 5 Ibidem, 23
 6 “Porque decidi nada saber entre vós, senão a Jesus Cristo e este crucificado.”
 7 ROSS, M. F. (2006). Preaching for revitalization: how to revitalize your church through your pulpit. Fearn, Roos-shire, Scotland: Christian Focus Publications. Página 82. Tradução livre.
 8 Apocalipse 2.1-7: “(1) Ao anjo da igreja em Éfeso escreve: Estas coisas diz aquele que conserva na mão direita as sete estrelas e que anda no meio dos sete candeeiros de ouro:  (2) Conheço as tuas obras, tanto o teu labor como a tua perseverança, e que não podes suportar homens maus, e que puseste à prova os que a si mesmos se declaram apóstolos e não são, e os achaste mentirosos; (3)  e tens perseverança, e suportaste provas por causa do meu nome, e não te deixaste esmorecer.  (4) Tenho, porém, contra ti que abandonaste o teu primeiro amor.  (5) Lembra-te, pois, de onde caíste, arrepende-te e volta à prática das primeiras obras; e, se não, venho a ti e moverei do seu lugar o teu candeeiro, caso não te arrependas.  (6) Tens, contudo, a teu favor que odeias as obras dos nicolaítas, as quais eu também odeio.  (7) Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas: Ao vencedor, dar-lhe-ei que se alimente da árvore da vida que se encontra no paraíso de Deus.”

3 COMENTÁRIOS

  1. ótima reflexão! Desejosos de alcançar as pessoas, muitos pregadores negociam a centralidade de sua pr‚dica para agregar mais pessoas para o rebanho de JESUS!

  2. Creio eu, que essa ‚ umas das verdades mais importante a ser exposta nos dias de hoje, pois o pulpito ‚ lugar de pregação onde o centro deve ser cristo. Deus abencoe vc pastor e que o Espirito Santo lhe use em nome de JESUS. E que DEUS continue usando a editora Vida Nova para abençoar nos brasileiros com a verdadeira teologia.

  3. Muito bom, vemos isto hoje nas músicas, quantas hoje falam de Jesus, digo a palavra literalmente quantas evocam diretamente a sua pessoa, gostei muito.

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