O Prefácio dos Dez Mandamentos – Êxodo 20.1,2

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A graça na lei do Senhor

ENTÃO falou Deus todas estas palavras, dizendo: Eu sou o SENHOR teu Deus, que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão. (Ex 20. 1, 2)

Introdução
Em Notícia do dia 12 de outubro de 2007, o Estadão Online  trazia estampado o seguinte: Americanos conhecem mais o Big Mac do que os Dez Mandamentos. Permitam-me ler a matéria: “Em um teste, americanos lembraram os sete ingredientes de um hamburguer Big Mac, do McDonalds, e os membros do programa de TV The Brady Bunch com mais facilidade que os Dez Mandamentos da Bíblia. Uma pesquisa da Kelton Research descobriu que 80 por cento de mil consultados sabiam o nome do principal ingrediente do sanduíche – dois hambúrgueres – mas menos de seis em cada 10 sabiam do mandamento ‘não matarás’. Menos de metade dos pesquisados – 45% – podiam lembrar o mandamento ‘honra a teu pai e a tua mãe’, mas 62 por cento sabiam que há picles no Big Mac. Bobby e Peter, os nomes menos lembrados da série Brady Bunch, foram citados por 43 por cento dos consultados, superando os 34% que sabiam do mandamento ‘lembra-te do dia de sábado’ e 29% se recordaram de ‘não tomarás o nome de Deus em vão’. A pesquisa foi patrocinada pela Comissão dos Dez Mandamentos em uma ação antes do lançamento do filme animado ‘Os Dez Mandamentos’, em 2007, como parte de uma campanha on-line para aumentar o interesse pelo tema”
A Necessidade dos Dez Mandamentos.

É um axioma, isto é, uma premissa considerada necessariamente evidente e verdadeira, que toda a moralidade é fundamentada na religião, principalmente cristã. A moral é fundamentada num sistema teológico, pois deriva de um Legislador Absoluto. Não sendo assim, tem-se a relativização da moral, fazendo com que certo e errado sejam conceitos particulares, pessoais ou de uma cultura em particular. Isto implica que a moral é necessária, pois senão se instalará a desordem. Cada povo ou cultura testemunha da lei moral em seus corações: zela-se pela justiça, pelo direito; há uma separação entre o belo e o feio; entre o bom e o mau; entre o bem e o mal; entre certo e errado. Isto existe conquanto haja diferença apenas no grau quanto a deveres morais específicos. O apóstolo Paulo a isto chama de “obra da lei escrita em seus corações” (Rm 2. 14, 15) testificando desta lei a própria consciência.

Qual a necessidade, então, por que Deus daria mandamentos revelados escritos?  Por que há no Ser Humano a tendência para o erro e a prática da injustiça; há nele uma corrupção tal que, deixando de lado toda e qualquer Lei, fazem-se leis para si; assim, corrompem-se na devassidão e na idolatria. João Calvino, neste aspecto, comenta que na Lei de Deus, Deus.

Atribuindo-se em primeiro lugar a autoridade de governar, nos ensina o temor e a reverência que devemos a sua divina majestade, e nos ensina em que consiste esta reverência. Logo, ao promulgar a regra da justiça (a qual nossa má e corrompida natureza é perpetuamente contrária e sente repugnância da mesma, não podendo corresponder a ela com a perfeição, por ser muito débil a nossa possibilidade de fazer o bem) nos convence de nossa impotência e da injustiça que existe em nós (Inst. II, viii, 1)

Sendo Deus o Legislador e Mestre, como registra as Escrituras: “Porque o SENHOR é o nosso Juiz; o SENHOR é o nosso legislador; o SENHOR é o nosso rei, ele nos salvará” (Is 33. 22); e Tiago diz que “há só um legislador que pode salvar e destruir” (Tg 4. 12), é dEle que temos que aprender e fazer a sua vontade. Ele é nosso criador e por isso devemos glorificá-lo, amá-lo e reverenciá-lo. Os seus mandamentos são dados, em primeiro lugar, para isto:

Porque ele estabeleceu um testemunho em Jacó, e pôs uma lei em Israel, a qual deu aos nossos pais para que a fizessem conhecer a seus filhos; Para que a geração vindoura a soubesse, os filhos que nascessem, os quais se levantassem e a contassem a seus filhos;  Para que pusessem em Deus a sua esperança, e se não esquecessem das obras de Deus, mas guardassem os seus mandamentos. E não fossem como seus pais, geração contumaz e rebelde, geração que não regeu o seu coração, e cujo espírito não foi fiel a Deus. (Sl 78. 5 – 8).

Magistralmente o Breve Catecismo de Westminster, nas perguntas 39 – 42, trata destes aspectos da vida cristã; mas não apenas isto. O catecismo ensina, fundamentado nas Escrituras, que Deus exige de todas as pessoas, como regra de obediência à sua vontade revelada, obediência à Lei Moral, resumidamente compreendida nos Dez Mandamentos, cujo resumo é: amar ao Senhor nosso Deus de todo o nosso coração, de toda a nossa alma, de todas as nossas forças e de todo o nosso entendimento; e ao nosso próximo como a nós mesmos.

O que é, portanto, os Dez Mandamentos, que se encontra a Lei Moral?

É a declaração da vontade de Deus, feita ao gênero humano, dirigindo e obrigando todas as pessoas à conformidade e obediência perfeita e perpétua a ela – nos apetites e disposições do homem inteiro, alma e corpo, e no cumprimento de todos aqueles deveres de santidade e retidão que se devem a Deus e ao homem, prometendo vida pela obediência e ameaçando com a morte a violação dela (CMW, P. 93).

 

Esta Lei é de vital importância a todos os homens, visto conter nela a Vontade de Deus para eles. A Lei Moral, os Dez Mandamentos, instrui aos homens sobre a natureza e vontade de Deus e sobre seus deveres como com Deus, mostrando a perfeição de Deus e a corrupção humana, e visto não poderem guardar fielmente esta Lei, a mesma conduz o pecador a Jesus Cristo. Voltemo-nos, agora, para o contexto dos Dez Mandamentos.

O Contexto dos Dez Mandamentos
Os Dez Mandamentos registrados em Êxodo 20. 1 – 17 é, segundo Betty Bacon (1991, p. 133), “um dos pontos altos da revelação divina, é seminal no pensamento bíblico, como indicam suas freqüentes e importantes ocorrências no NT”. Outros escritores concordam com isto, crendo que com o Decálogo, chega-se ao clímax do livro de Êxodo; o Decálogo é o tema central e mais exaltado do Livro de Êxodo. O que foi registrado antes era preparação para ele; e tudo que foi registrado depois dele é resultado e suplemento. Nas Escrituras o Decálogo é chamado “as palavras da aliança, os dez mandamentos” (Ex 34. 28). O próprio formato dos Mandamentos revelam que eles são formulados como um pacto entre Deus e os Homens.  “Então vos anunciou ele a sua aliança que vos ordenou cumprir, os dez mandamentos, e os escreveu em duas tábuas de pedra” (Dt 4. 13).

Israel acabara de ser libertado da escravidão do Egito, chegando ao Deserto do Sinai no terceiro mês depois de sua saída. Acamparam aos pés do Monte Sinai (19. 2a). Moisés sobe ao Monte e recebe as instruções de Deus acerca do que Deus faria ao Povo, ou seja, Deus anuncia o Pacto com eles (19. 3 – 15). Este chamado à obediência (v. 5) separaria o povo para um propósito especial (5b – 6). No capítulo vinte Deus apresenta as estipulações do Pacto com bastantes detalhes. Note que nos vv. 2 – 17 os imperativos categóricos são expressos por verbos e não por substantivos. Não há espaço para debates. Deus deu ao Seu Povo Dez Mandamentos, não “Dez Sugestões”. O Povo agora sabia que Deus estava cumprindo as promessas a Abraão, Isaque e a Jacó (2.24). O Povo promete obedecer às estipulações do Pacto (19. 8; 24. 7). A Aliança foi selada com sangue (24.8). A Lei não foi dada, portanto, com o objetivo de amedrontar, mas para que se temesse ao Senhor “a fim de que não pequeis” (20. 20).

Observe como inicia a entrega da Lei: “ENTÃO falou Deus todas estas palavras, dizendo: Eu sou o SENHOR teu Deus, que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão”(Ex 20. 1, 2). As “Palavras” seriam dadas a seguir, como registra os vv. 2 – 17. A promulgação das “Dez Palavras de Deus” continha a Lei fundamental da Aliança entre Deus e seu povo. Pode parecer estranho para muitos, mas Deus não deu a Lei para salvar o Povo, mas porque eles já haviam sido salvos: “que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão”. Deus apenas lembrou-se de Sua Aliança com os Patriarcas, isto é, Deus foi fiel ao juramento que ele mesmo fez. Diz o escritor da Carta aos Hebreus: “Porque, quando Deus fez a promessa a Abraão, como não tinha outro maior por quem jurasse, jurou por si mesmo, Dizendo: Certamente, abençoando te abençoarei, e multiplicando te multiplicarei” (Hb 6. 13, 14). Assim, encontramos Graça na própria Lei, confirmando as palavras do Apóstolo Paulo: “a lei é santa, e o mandamento santo, justo e bom” (Rm 7. 12), principalmente quando alguém dela bem se utiliza. Disse ele:

Sabemos, porém, que a lei é boa, se alguém dela usa legitimamente; Sabendo isto, que a lei não é feita para o justo, mas para os injustos e obstinados, para os ímpios e pecadores, para os profanos e irreligiosos, para os parricidas e matricidas, para os homicidas, Para os devassos, para os sodomitas, para os roubadores de homens, para os mentirosos, para os perjuros, e para o que for contrário à sã doutrina, Conforme o evangelho da glória de Deus bem-aventurado, que me foi confiado” (I Tm 1. 8 – 11).

 

Neste texto Paulo une a Lei do Senhor ao Evangelho da Glória de Deus. Não devemos, portanto, nos esquecer que “o Decálogo começou no âmbito da graça e da redenção” (KAISER, p. 212)

Podemos compreender, agora, que a Lei do Senhor, para nós, justificados, é boa, pois nos serve de orientação. Não é um fardo, “os seus mandamentos não são pesados” (I Jo 5. 3b). Pelo contrário, a “Lei é a instrução de Deus na justiça” [e] o “seu lugar no crescimento do cristão é fundamental” e neste sentido o Senhor Deus exige Fé para que se obedeça à sua Lei: “Porquanto te ordeno hoje que ames ao SENHOR teu Deus, que andes nos seus caminhos, e que guardes os seus mandamentos, e os seus estatutos, e os seus juízos, para que vivas, e te multipliques, e o SENHOR teu Deus te abençoe na terra a qual entras a possuir” (Dt 30.16).

“O Decálogo é o resumo da vontade do Pai por meio do qual ele instrui e disciplina seus filhos. Em vista da perspectiva antropocêntrica (egoísmo, narcisismo) da nossa geração, a ética cristã oferece uma perspectiva teocêntrica” (VanGemeren, p. 217). Esta perspectiva nos faz ver a Graça na Lei do Senhor, percebendo que sua aplicação na vida cristã é a santificação. Este é o chamado “Terceiro Uso da Lei” cuja função é revelar a vontade de Deus àqueles que crêem (Institutas 2.7.12). Lembre-se do Prefácio da Lei: “te tirei da terra do Egito, da Casa da Servidão” (Ex. 20. 2b). A Graça da Lei do Senhor está em nos exortar à obediência e nos estimular à santidade, pois o Senhor revela a sua vontade Nela.

O Prefácio da Lei do Senhor
Por fim, com base no Prefácio da Lei do Senhor encontramos os três motivos dos Dez Mandamentos:

a. O Senhor falou estas palavras – Ele se Revelou. Novamente a manifestação da Graça ao seu povo, pois se manifestou como um ato de Graça a fim de trazer os termos da Aliança e as Promessas, bem como as Penas. A Graça da Lei em Deus revelar a Sua vontade, mostrando o que lhe agrada e o que lhe desagrada; neste ponto já temos a perfeição da Lei do Senhor, pois é a expressão do seu caráter. Veja, se Deus nos diz “não tomarás o nome do Senhor teu Deus em vão” é porque Ele é um Deus Santo que requer reverência diante Dele em todas as ocasiões e de tudo que lhe diga respeito.

b. Ele é o Senhor teu Deus – Aqui está o imperativo dos Dez Mandamentos – Ele é o SENHOR DEUS. Ele é o Doador e Legislador da Lei Perfeita evocando para si a mais alta autoridade. Era comum os Reis e Imperadores iniciarem seus editos ou Alianças com os seus nomes. Isto conferia autenticidade e exigiam cumprimento. O Senhor prefacia o Decálogo com “Eu Sou o SENHOR teu DEUS”. Com isto Deus preparava as mentes do seu povo para obedecer-lhe.

c. Ele é o Redentor do seu povo –
Este é o terceiro peso da Lei do Senhor pelo qual manifesta a Graça: Ele é o Redentor do seu Povo. Aqui é mencionado outro atributo do Senhor na Redenção: Misericórdia. Para os que pensam que a Lei do Senhor não é para os que já têm fé, isto é, para os redimidos, Deus revela exatamente o contrário: porque vos tirei da terra do Egito, da Casa da Escravidão “para que ouçam e aprendam e temam ao SENHOR vosso Deus, e tenham cuidado de fazer todas as palavras desta lei; E que seus filhos, que não a souberem, ouçam e aprendam a temer ao SENHOR vosso Deus” (Dt 31. 12, 13). Assim, a Lei não foi dada ao crente como meio de salvação, mas porque já são salvos.

E, daí?
Notadamente existe uma atitude antinomista, quer dizer, uma atitude contrária à Lei do Senhor. Entre os Cristãos o desconhecimento dos Dez Mandamentos e, pior, o desrespeito por eles demonstra uma fraqueza no caráter e na vida espiritual. Este desprezo pela vontade revelada de Deus leva-nos a nos distanciar de um processo de santificação bíblico, caindo no que se tenta evitar: no Legalismo. Por causa disto criamos outras leis e preceitos de homens. As conseqüências são danosas, pois, abandonando a Lei do Senhor “nos tornamos leis para nós mesmos”, diz Paulo. O salmista já louvava:

Oh! quanto amo a tua lei! É a minha meditação em todo o dia. Tu, pelos teus mandamentos, me fazes mais sábio do que os meus inimigos; pois estão sempre comigo. Tenho mais entendimento do que todos os meus mestres, porque os teus testemunhos são a minha meditação. Entendo mais do que os antigos; porque guardo os teus preceitos. Desviei os meus pés de todo caminho mau, para guardar a tua palavra. Não me apartei dos teus juízos, pois tu me ensinaste. Oh! quão doces são as tuas palavras ao meu paladar, mais doces do que o mel à minha boca. Pelos teus mandamentos alcancei entendimento; por isso odeio todo falso caminho (Sl 119. 97 – 104; Cf. v. 113, 163).

O Senhor Deus, através de Seu Filho Jesus Cristo, exorta-nos a guardar os seus mandamentos, dizendo-nos que se o amamos “guardaremos os seus mandamentos” (Jo 14. 15). Isto não é feito para que possamos ser Salvos. Lembre-se, Deus é o nosso Senhor e o nosso Redentor, já nos livrou da escravidão do pecado. Esta é a prova de nosso amor para com o nosso Deus: “E o amor é este: que andemos segundo os seus mandamentos. Este é o mandamento, como já desde o princípio ouvistes, que andeis nele” (II Jo 6).

A prática da vida cristã à parte do que Deus nos revelou objetivamente nas Tábuas da Lei nos conduzirá a uma vida subjetiva cujas doutrinas, comportamentos, ética e moral serão decididos na cabeça de cada um individualmente. As conseqüências já foram listadas acima: vida cristã sem piedade ou santidade.
Impressionam-me as palavras de Davi no Salmo 19:

A lei do SENHOR é perfeita, e refrigera a alma; o testemunho do SENHOR é fiel, e dá sabedoria aos símplices. Os preceitos do SENHOR são retos e alegram o coração; o mandamento do SENHOR é puro, e ilumina os olhos. O temor do SENHOR é limpo, e permanece eternamente; os juízos do SENHOR são verdadeiros e justos juntamente. Mais desejáveis são do que o ouro, sim, do que muito ouro fino; e mais doces do que o mel e o licor dos favos. Também por eles é admoestado o teu servo; e em os guardar há grande recompensa (vv. 7 – 11).

O Senhor bondosa e misericordiosamente nos deu a sua Lei, os Dez Mandamentos. E todos os homens, e em especial os seus crentes, devem obedecê-los em Cristo Jesus. Somos imperfeitos, mas recorremos ao Senhor Jesus Cristo e Nele guardaremos os seus mandamentos. A Lei do Senhor nos mostra a Graça de Deus, a Misericórdia do Redentor e revela-nos se verdadeiramente amamos a Ele.

1 COMENTÁRIO

  1. Pois ‚, e onde fica o s bado? Se nos atentarmos ao texto de Apocalipse 14:6, podemos perceber que um povo simbolizado pelo anjo, chama a atenção para a adoração do Criador, usando termos como: os c‚us, o mar e a terra…curioso saber ‚ que a justificação que Deus faz ao pedir a guarda do mandamento do s bado são justamente as mesmas palavras (Òxodo 20:8 a 11) Não são os cristãos que devem guardar o s bado, ‚ o s bado que deve guardar os verdadeiros cristãos (Hans k. Larrondelle)

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