Cristãos, muçulmanos e secularistas: uma resenha crítica de Herege

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1. Introdução

Em seu livro autobiográfico Infiel (2006),1 Ayaan Hirsi Ali (1969) contou ao mundo como deixou sua cultura de origem — a cultura tribal e islâmica da Somália — para se tornar cientista política, parlamentar e ativista contra o radicalismo islâmico na Holanda. Trata-se de uma narrativa cativante, muito bem escrita, sumamente honesta, inteligente, sensível e repleta de lições que transcendem em muito a questão do islamismo.

Em 2010 Ali publicou um novo livro, Nômade,2 também cheio de elementos autobiográficos e mantendo todas as qualidades do anterior, mas com foco em alguns eventos posteriores de sua vida, em especial a mudança para os Estados Unidos e a relação conturbada com a família a partir de sua apostasia. O livro, porém, não é apenas uma biografia continuada; é mais dissertativo que o anterior e discute amplamente a relação dos americanos com o islã, tanto dentro quanto fora das fronteiras de seu país. A autora apresenta intencionalmente a história de sua família sobretudo enquanto exemplo vívido da opressão imposta por um modo de vida mal integrado à modernidade. Nota-se nessa segunda obra, em comparação com a primeira, um certo amadurecimento intelectual da autora; por outro lado, o livro oferece menos da perspicaz pessoalidade narrativa que constitui, em minha opinião, a melhor qualidade dela.

Apresento aqui uma resenha de Herege (2015),3 o último livro da autora. Devo esclarecer desde já que, embora esta resenha vá assumir um tom predominantemente crítico, nem por isso pretendo instigar qualquer desprezo pelo livro, nem pelo conjunto da obra de Ali, e muito menos por sua pessoa. Ao contrário, recomendo fortemente Herege para os cristãos interessados em entender melhor o problema do islã e os modos equivocados pelos quais o Ocidente tem reagido a ele. A despeito de todas as ressalvas, considero-me antes de tudo um admirador de sua autora. Se dou menos ênfase às suas qualidades aqui, ao menos parte do motivo é que elas são abundantes e muito fáceis de se perceber sem o auxílio de uma resenha.

2. Resumo

Sob vários pontos de vista, Herege prossegue na mesma tendência já delineada nos livros anteriores. Igualmente bem escrito, porém mais curto e predominantemente dissertativo, ele se propõe a explicar “por que o islã precisa de uma reforma imediata”, como nos informa o subtítulo. Sua tese parte da constatação simples de que “o islamismo não é uma religião pacífica”, ou seja, que os “islamitas radicais […] são movidos por uma ideologia política, uma ideologia com raízes no próprio islã, no livro santo do Alcorão e na vida e ensinamentos do profeta Maomé descritos no hadith” (p. 10).

Naturalmente, Ali não pretende afirmar que o islã se resume a isso. Segundo ela, existem três categorias de muçulmanos. Os primeiros são os indicados acima: os “fundamentalistas” — grupo minoritário, porém crescente, que vive seu credo “ao pé da letra”, venera o islã original e considera “um imperativo de sua fé que ela seja imposta a todos os demais” (p. 22). O segundo é o grupo majoritário dos que “são leais ao credo e fazem suas devoções com fervor, mas não se sentem inclinados a praticar violência”; o maior problema desses muçulmanos é o fato de viverem “em incômoda tensão com a modernidade” (p. 24). Há, enfim, uma segunda (e também crescente) minoria, que a autora chama de “muçulmanos modificados”, composta sobretudo por “crentes reformistas” (p. 25), hereges aos olhos dos grupos mais tradicionais.

Embora não seja mais muçulmana, é com esse terceiro grupo que Ali se identifica. O objetivo declarado do livro é o estabelecimento de categorias com base nas quais “identificar e repudiar” os maus aspectos do islã, buscando ao mesmo tempo persuadir o grupo majoritário a “aceitar essa mudança e rejeitar o chamado […] à intolerância e à guerra” (p. 29). Ali tem consciência de que não é a primeira a propor uma reforma do islã, mas se considera pioneira em sua capacidade de especificar “exatamente o que precisa ser reformado”. Segundo ela (p. 32),

Os cinco princípios a ser reformados são: 1. A posição de Maomé como semidivino e infalível, juntamente com a interpretação literal do Alcorão, em especial as partes que foram reveladas em Medina; 2. O investimento em uma vida após a morte em detrimento da vida antes da morte; 3. A sharia, o conjunto de leis derivadas do Alcorão, o hadith e o resto da jurisprudência islâmica; 4. A prática de dar a indivíduos o poder de aplicar a lei islâmica ordenando o certo e proibindo o errado; 5. O imperativo de fazer a jihad, ou guerra santa.

Após um capítulo introdutório de natureza autobiográfica e de um outro ressaltando os contrastes entre o mundo islâmico e o Ocidente quanto aos rumos da religião e da política, cada um desses cinco tópicos é alvo de discussão em um capítulo separado. Segue-se uma crítica mordaz e muito pertinente da perversidade, cegueira e tibieza do relativismo cultural no Ocidente e sua tolerância do intolerável. Na conclusão, a autora apresenta uma análise esperançosa das tendências de abertura do mundo islâmico em relação aos direitos humanos e a uma mentalidade mais democrática. O livro contém ainda um interessante apêndice sobre alguns “reformadores e dissidentes muçulmanos” (p. 239).

3. Crítica

O livro possui ao menos três excelentes qualidades. A primeira é a extrema clareza de seus argumentos (inclusive dos equivocados). A segunda está no interessante e relativamente grande volume de dados apresentado. A terceira é a perspectiva privilegiada da autora, cuja sensibilidade e inteligência lhe permitem tirar excelente proveito de sua ampla experiência pessoal tanto das culturas islâmicas quanto das ocidentais. A comparação com suas obras anteriores revela nitidamente um considerável amadurecimento intelectual. Sem dúvida, muitos aspectos do livro, tanto positivos quanto negativos, mereceriam uma discussão atenta, o que não será possível nesta resenha. Será dada ênfase àquilo que os erros e acertos da obra podem ensinar aos cristãos que se preocupam com a complicada questão do relacionamento entre o islã e o Ocidente.

3.1. História islâmica

Tomarei como pontos de partida dois exemplos de má interpretação histórica, que revelam uma das principais limitações da obra. Segundo a autora, a razão humana se tornou mal vista no mundo islâmico em grande parte pela influência de Abu al-Ghazali (1058-1111), que “detestava os filósofos da Grécia antiga” e “considerava a razão humana um câncer no islã”. Ali acrescenta que “Sua obra mais famosa é Tahafut al-falasifa [A incoerência dos filósofos], na qual ele critica e refuta as ideias da Antiguidade” (p. 109-110). Esse parecer, no entanto, é diretamente contrariado pelo melhor conhecimento disponível sobre o pensamento islâmico medieval. Veja-se, por exemplo, a avaliação bem mais positiva, sensível e bem informada de Massimo Campanini:

Al-Ghazali pode, de certo modo, ser considerado um intelectual muçulmano exemplar, e não apenas porque foi um eminente teólogo e jurista, mas sobretudo porque soube harmonizar admiravelmente filosofia, mística e direito em um sistema que, não obstante algumas oscilações e contradições, figura como a máxima conquista intelectual do Islã no apogeu de sua maturidade especulativa. […] O zelo reformador de al-Ghazali o persuadia do fato de que a filosofia […] constituía uma ameaça, ou pelo menos uma perigosa sedução, para o espírito autenticamente religioso. Por isso analisou com imparcial objetividade as teses de seus adversários em A intenção dos filósofos, e as confutou na célebre A incoerência dos filósofos […]. Apesar da intenção de refutar, al-Ghazali era tudo menos um “irracionalista”. Antes de tudo, tentou contestar a filosofia não recorrendo a anátemas e preconceitos teológicos, mas através de instrumentos filosóficos, dialéticos e demonstrativos: contestou a filosofia com a filosofia, enfim. Em segundo lugar, ao expor suas próprias ideias originais fez com frequência uso de terminologia, categorias e conceitos claramente filosóficos. […] A historiografia mais atual […] é sempre propensa a reconhecer em al-Ghazali — seu malgrado — um cripto-filósofo.4

Podemos acrescentar a isso a observação do grande islamólogo Henry Corbin (1903-1978)5 de que os intelectuais do mundo islâmico frequentemente se surpreendem com a importância exagerada atribuída a al-Ghazali no Ocidente; Ali comete claramente esse erro ao afirmar que ele “continua a ser considerado por muitos no islã a segunda autoridade islâmica, logo depois de Maomé” (p.110). Aqui encontramos a primeira limitação da obra. Ali demonstra estar bem informada sobre as mais diversas manifestações do radicalismo islâmico no presente, e sem dúvida conhece de perto, de dentro, a cosmovisão do muçulmano típico. Mas não devemos esperar dela nenhum preparo para avaliar o islã enquanto movimento histórico e enquanto civilização, e tampouco devemos esperar que ela seja capaz de entender suas raízes religiosas e intelectuais mais profundas. Essa superficialidade prejudica alguns aspectos de suas análises — por exemplo, sua adesão irrefletida ao pressuposto consideravelmente simplista de que o islã radical de hoje é fiel à tradição de sua religião.

Duas observações devem, porém, ser feitas em defesa da autora. A primeira é que seu desinteresse pelo islã em um nível mais profundo é psicologicamente bastante compreensível. Estamos falando de uma mulher que sofreu circuncisão feminina na infância, viveu vários tipos de opressão em uma cultura islâmica um tanto tribal, foi banida pela família por sua rejeição da fé e coleciona ameaças de morte por isso. É muito natural que ela reaja com desprezo e indignação diante daqueles “Analistas irritantemente idiotas [cujos] artigos falavam do islã que salvara Aristóteles e descobrira o zero [e] falavam no islamismo como religião da paz e da tolerância, sem um pingo de violência”6; sobretudo se, como é o caso, o fazem com motivações politicamente corretas. Da mesma forma, é perfeitamente compreensível que, em reação à opressão de uma divindade distante e implacável, reforçada constantemente por toda uma estrutura social sufocantemente coletivista, ela tenha terminado por adotar o ateísmo e o liberalismo político, passando a ver na liberdade e no individualismo os valores supremos. Esses fatos devem despertar nossa compreensão e empatia, embora não devam nos levar a concordar integralmente com as ênfases daí decorrentes.

A segunda observação a ser feita em favor de Ali é que ela tem certa consciência das limitações de seu empreendimento: ela deixa claro já na introdução que o livro não é sobre história (p. 30) nem sobre teologia (p. 33), e sabe que alguns “alegarão que não tenho qualificações para discutir essas questões complexas da tradição teológica e legal” (p. 32-33). Seu propósito é, antes de tudo, “uma intervenção pública no debate acerca do futuro do islã” (p. 33). Devo dizer, no entanto, que vejo essa restrição do escopo como parte do problema, juntamente com o pressuposto quase explícito de que o objetivo do livro não pode ser prejudicado pela ignorância da autora sobre os temas de que não trata. Mesmo sendo verdade que alguns leitores maliciosos se aproveitarão dessas falhas para impugnar o que há de bom e correto na obra, não podemos deixar de ficar atentos às consequências dessa má delimitação e do desinteresse que está por trás dela.

3.2. História cristã

O segundo exemplo de má interpretação histórica se encontra no capítulo 2, intitulado “Por que não houve uma reforma muçulmana?”. Não se trata, porém, de um erro sobre o islã, e sim sobre a Reforma Protestante. Naturalmente, o ateísmo de Ali não lhe permite cultivar um interesse genuíno pela questão religiosa; ainda assim, ela saúda a Reforma por ver nela o início da libertação da “consciência individual da autoridade hierárquica e sacerdotal [que] deu espaço ao pensamento crítico em todos os campos da atividade humana”. O contexto imediato deixa claro que seu conceito de “pensamento crítico” é eminentemente iluminista. Ainda assim, em vários momentos a autora traça paralelos entre o propósito de Martinho Lutero (1483-1546) e o projeto de seu livro: além de comparar modestamente suas “cinco teses” sobre o que precisa mudar no islã com as Noventa e Cinco Teses do reformador, ela relata que sua intenção inicial era escrever o livro em forma ficcional, contando “a história de um jovem carismático imã em Londres, que se revelaria um Lutero muçulmano contemporâneo” (p. 225).

Para os leitores mais familiarizados com a obra de Ali, essa comparação é um tanto surpreendente. Afinal, ela está mais acostumada a se comparar a Voltaire (1694-1778) — o que de fato lhe cai muito melhor, dado o seu compromisso explícito com os ideais iluministas e secularistas. Talvez o apelo a Lutero tenha sido antes de tudo um artifício retórico e literário, pois permite uma maior identificação com a maioria dos “muçulmanos modificados” que de modo algum se consideram apóstatas. Ao mesmo tempo, porém, é evidente que há sinceridade na homenagem prestada por ela ao reformador alemão e em sua convicção da importância histórica e cultural da Reforma. Na verdade, Ali apresenta o processo histórico da cristandade ocidental como exemplo a ser seguido pelo mundo islâmico, nos seguintes termos (p. 234):

Em todos os livros sagrados, na Bíblia, bem como no Alcorão, encontramos trechos que sancionam a intolerância e a desigualdade. Mas, no caso do cristianismo, houve mudanças. Nesse processo de mudança, as pessoas que queriam manter o status quo apresentaram os mesmos argumentos que hoje os muçulmanos apresentam: que se sentiram ofendidos, que a nova forma de pensar era uma blasfêmia. Com efeito, foi por meio de um processo de blasfêmias repetidas que cristãos e judeus evoluíram e cresceram para entrar na modernidade.

Se resta alguma incerteza quanto ao tipo de cristianismo que Ali aprecia, um trecho de outro livro pode deixar isso mais claro:

Tive o prazer de conhecer cristãos cuja concepção de Deus difere muito da que os muçulmanos têm de Alá. São os membros de uma cristandade reformada e parcialmente secularizada que seria uma aliada útil na luta contra o fanatismo islâmico. Esse Deus cristão moderno é sinônimo de amor. Seus agentes não pregam o ódio, a intolerância e a discórdia; esse Deus é misericordioso, não almeja o poder temporal e não concorre com a ciência. Seus seguidores enxergam na Bíblia um livro repleto de parábolas, e não uma sequência de ordens diretas que devem ser obedecidas. [Outros, porém,] amaldiçoam a existência de outros grupos. Eles adotam uma leitura literal da Bíblia e rejeitam explicações científicas para a existência do homem e da natureza em nome de um “design inteligente”.7 Tais grupos cristãos fundamentalistas investem boa parte de seu tempo e energia na tentativa de converter novos fiéis. Mas muito daquilo que pregam contradiz os princípios centrais do Iluminismo.8

Essas concepções certamente colocam Ali em uma posição mais aberta que a de ateus fanáticos como Richard Dawkins, Sam Harris e Christopher Hitchens (1949-2011) — que, aliás, são ou foram amigos pessoais da autora e cujos endossos figuram na contracapa de Nômade (e, no caso de Dawkins, também em Herege). Apesar disso, é fácil perceber que seu modelo de cristianismo aceitável está nas modalidades teológicas mais liberais, e que contradizer o iluminismo significa, para ela, cometer a heresia suprema. O Deus cristão só terá valor se não estiver irado contra os pecados da humanidade, não fizer exigências ao Estado e não se opuser ao naturalismo científico. Para o leitor teologicamente bem informado, fica patente também que Ali possui uma concepção deveras confusa, deficiente e caricatural do cristianismo conservador e de temas correlatos, como exegese bíblica e design inteligente (que, na verdade, nada tem de particularmente cristão ou mesmo religioso no sentido estrito).
   
Além disso, muito da força retórica da queixa de Ali se baseia na falta de clareza quanto ao que significa “amaldiçoar” a existência de outros grupos; dependendo do sentido que se lhe dê, a acusação pode ser falsa ou apenas inócua. A própria Ali amaldiçoa nesse mesmo parágrafo a existência de grupos não comprometidos com o iluminismo. Na verdade, o livro todo pode ser visto como uma maldição lançada sobre os muçulmanos que rejeitam a modernidade e como um esforço para convertê-los. Isso não faz dela uma pregadora de “ódio, intolerância e discórdia”. O problema é que Ali não concede aos outros o direito de agir do mesmo modo, pois para ela é impossível que haja inteligência e civilidade fora do iluminismo.
   
O propósito da presente resenha não é diretamente apologético. Desejo apenas apontar que as categorias do livro são pobres demais para permitir qualquer apreensão confiável da diversidade e das complexidades de uma religião como o cristianismo, ainda que apenas no plano sociológico. Em especial, sua apropriação da figura de Lutero para os propósitos de uma reforma do islã é duplamente ilegítima. Em primeiro lugar, é nada menos que ridícula a pretensão de reformar uma religião à qual não se pretende pertencer, e não há uso retórico do conceito de heresia que baste para compensar isso. Em segundo lugar, uma vez que Ali sustenta que a crença na infalibilidade de um livro sagrado é incompatível com a tolerância religiosa e com o exercício da razão — o que constitui a primeira de suas cinco teses —, não faz sentido que ela se inspire no mesmo reformador que se comprometeu explicitamente com a convicção contrária diante do imperador na Dieta de Worms:

A não ser que alguém me convença pelo testemunho da Escritura Sagrada ou com razões decisivas, não posso me retratar. Pois não creio nem na infalibilidade do papa, nem na dos concílios, porque é manifesto que frequentemente se têm equivocado e se contradito. Fui vencido pelos argumentos bíblicos que acabo de citar e minha consciência está cativa à Palavra de Deus.9

A mentalidade iluminista vê na liberdade da consciência um bem inegociável, na rejeição do que quer que seja “moderno” uma evidência de obscurantismo e na religião uma negação das potências racionais da mente humana. Não há lugar nela para alguém que proclame liberdade contra uma autoridade antiga amparado em outra ainda mais antiga e declare sem constrangimentos que sua consciência é (e deve ser) escrava de um velho livro inspirado por Deus. Também não se encaixa bem na cosmovisão iluminista a possibilidade de uma racionalidade genuína que não se pretenda autônoma em relação ao seu Criador. Protestantes liberais seduzidos pela modernidade, católicos conservadores ressentidos e secularistas declaradamente anticristãos têm frequentemente minimizado (ou ignorado de todo) as profundas diferenças de motivação religiosa que impulsionaram a Reforma e as Luzes.10 E isso não chega a ser surpreendente, pois o desmanche de tal confusão seria fatal à cuidadosamente elaborada autoimagem de todos esses grupos.

3.3. Secularismo

As análises de Ali sobre o islã se sobrecarregam de limitações na medida em que são moldadas por uma cosmovisão que se formou no combate político e cultural contra o cristianismo. Naturalmente, a solução proposta não pode ser melhor que a própria descrição do problema. Em consequência disso, por mais verdadeiras e pertinentes que sejam as denúncias da autora quanto ao perigo do islã radical, o cristão consciencioso não deve ceder facilmente a um fervor apologético mal orientado contra uma religião rival, nem ao ímpeto de defender a “nossa” civilização. Em outras palavras, o cristão não deve tomar partido nessa luta de monstros entre o secularismo liberal-iluminista e os restos degenerados do que já foi a civilização islâmica.11 Na verdade, haverá momentos em que teremos de tomar o partido dos vilões de Ali. Cito um único exemplo, extraído do capítulo 4, intitulado “Os que amam a morte: o enfoque letal do islã em uma vida após a morte” (p. 115):

Desde quando me tornei capaz de aprender as lições mais elementares, ensinaram-me que nossa vida na Terra é breve e temporária. Um sem-número de pessoas morreu durante minha infância: parentes, vizinhos, estranhos, de doença, de desnutrição, por violência, por opressão. A morte estava o tempo todo na ponta da língua para nós. Ficamos tão habituados a ela, e ela se tornou parte de nós a tal ponto que não falávamos de nada sem mencioná-la. Eu não sabia planejar qualquer coisa com um amigo sem dizer “Até amanhã, se eu estiver viva”, ou “Se Alá quiser”. E essas palavras faziam sentido, pois eu sabia que podia morrer a qualquer momento. […] Acreditei em tudo isso sem questionar — até que cheguei à Holanda. Lá ninguém falava sobre a morte, muito menos sobre vida após a morte. Diziam com segurança “Até amanhã!”. E, se eu respondesse: “Se eu estiver viva!”, eles estranhavam e replicavam: “É claro que estará viva! Por que não haveria de estar?”.

Há muita coisa séria e pertinente na crítica à mentalidade islâmica nesse capítulo, em especial quanto a uma combinação de fatalismo e apatia que resulta no desprezo pela vida humana até ao limite da crueldade. Mas a alternativa secularista, que insiste em ignorar tanto a fragilidade humana como a inevitabilidade e a imprevisibilidade da morte (cuja simples menção é motivo de escândalo), simplesmente não é uma opção para o cristão. Por levar a sério a soberania de Deus sobre nossos planos (Tg 4.13-16) e adquirir sabedoria pela contagem dos próprios dias (Sl 90.12), o cristão deve rejeitar essa louca e estúpida pretensão de soberania humana e, nesse sentido, identificar-se mais com a Ali criança que com a adulta; com a muçulmana, e não com a liberal. Em outras palavras, se vamos criticar a visão islâmica sobre a morte, certamente não será nos mesmos termos da crítica iluminista.
   
O mesmo pode ser dito sobre vários outros aspectos do conflito entre muçulmanos e secularistas. Por exemplo, a despeito do tradicional autoritarismo islâmico (refiro-me de modo específico à dificuldade de conviver em situação de igualdade civil e política com adeptos de outras posições religiosas), os muçulmanos estão corretos em rejeitar a ideia iluminista de que a religião é essencialmente uma questão de foro íntimo e que, portanto, a única religião aceitável é aquela que não tem quaisquer pretensões de influência sobre a vida pública. A ideia de uma revelação objetiva feita por um Deus objetivo, com implicações para a totalidade da vida, inclusive suas dimensões social, política, jurídica, moral, cultural e econômica, é algo que cristãos e muçulmanos têm em comum, e nisso ambos se opõem à postura secularista, que vê aí uma prova de fanatismo, estreiteza mental, irracionalidade e perigo — se não consumado, ao menos potencial.
   
Essas considerações resumem o que vejo como a deficiência principal do livro, e que é também o problema fundamental do próprio secularismo iluminista esposado pela autora. A discussão precedente mostra que não devemos levar tão a sério a afirmação de que não se trata de um livro de história ou de teologia: há, sim, uma teologia e uma filosofia da história implícitas na obra; há, na verdade, toda uma cosmovisão, um compromisso fundamental, guiando-a do princípio ao fim. Mas reconhecer a natureza teológica, teorreferente, religiosa e mesmo fiduciária de seus posicionamentos e compromissos é algo impossível para a autora. A cegueira característica do secularismo está justamente no fato de que ele não se vê como religioso, e sim como uma instância neutra encarregada de colocar a religião em seu devido (e modesto) lugar. E a tarefa de levar a cabo esse intento caberá à política, verdadeira detentora da posição de honra.
   
A idolatria da política é o que caracteriza o iluminismo e todos os seus herdeiros. É por isso que Herege é, em última análise, um livro político ou, quando muito, cultural. A autora não tem nenhum interesse sério pelo islã enquanto religião:12 ele só lhe interessa efetivamente enquanto aliado ou adversário na propagação de sua nova fé, o iluminismo. Creio que é por isso que o analista político Timothy Garton Ash a descreveu como “uma corajosa, franca e levemente simplista fundamentalista do Iluminismo”:13 não há, da parte dela, nenhum esforço sério para se situar fora de seu programa redentivo predileto.

4. Solução

No restante desta breve análise, pretendo oferecer sumariamente três princípios que julgo serem chaves de compreensão valiosas para os cristãos que desejam construir uma visão saudável sobre o tema do islã evitando os principais equívocos cometidos por Ali e outros analistas comprometidos com o secularismo.

4.1. Primazia da religião

Antes de tudo, o cristão está melhor preparado para abordar o islã enquanto religião, que é o que ele é antes de ser qualquer outra coisa. O secularismo não dá a devida importância à religião. É por isso que suas análises do islã, bem como do cristianismo e de si mesmo, tendem sempre a varrer para debaixo do tapete o aspecto especificamente religioso, concedendo equivocadamente a primazia a aspectos culturais, históricos, sociológicos, jurídicos, econômicos, linguísticos etc.
   
Devemos, portanto, estar dispostos a dedicar muito mais esforços a um entendimento profundo das teologias islâmicas e de como elas moldam toda a cosmovisão islâmica, inclusive seu entendimento de temas políticos, sociais e culturais, sem deixar de atentar para a ampla variedade de respostas que o islã já forneceu e ainda fornece.14 Naturalmente, isso não se resume à capacidade de elaborar uma lista das posições teológicas e éticas dos muçulmanos, pois requer uma familiarização mais profunda com as sensibilidades e categorias dentro das quais as mentes muçulmanas operam. Devemos empreender essa tarefa tendo em mente que os iluministas não se iludem à toa: penetrar seriamente na cosmovisão de outra pessoa, em especial em um ambiente cultural estranho, é um procedimento difícil, penoso, demorado e doloroso, de modo que não podemos esperar um sucesso rápido e fácil.
   
Nesse contexto, vale a pena destacar que nós, cristãos ocidentais, estamos em melhores condições de desenvolver para com os muçulmanos uma espécie de empatia intelectual (que de modo algum é sinônimo de acordo). Nós conhecemos bem os juízos simplistas que a tradição iluminista tem lançado constantemente sobre nossa fé, oriundos da ignorância motivada pelo desinteresse e pelo desprezo — juízos que se manifestam tanto na condenação preconceituosa quanto na aprovação condescendente e mal informada.15 A tradição revolucionária ocidental construiu sua identidade e programas políticos em oposição (quase sempre) consciente à cristandade, vista como o inimigo número um. Não deveria nos surpreender demais a constatação de que essa mesma tradição adota as mesmas posturas, com as mesmas más consequências intelectuais e práticas, na compreensão de outras religiões tradicionais.
   
Ao examinarmos essas religiões e os problemas que elas nos colocam, a consciência dos preconceitos iluministas contra nós e de suas consequências deve nos incitar a uma postura diferente: devemos nos precaver contra todas as armadilhas retóricas e racionais que nos empurram para respostas fáceis, independentemente do partido que tomem. Não há tese sobre o islã que não possa ser demonstrada uma vez que tenhamos cuidadosamente selecionado os fatos que nela se encaixam e tratado os demais como exceções raras e irrelevantes. Por exemplo, condenar o islã como um todo por causa de ataques terroristas não é congruente com os fortes protestos que fazemos quando alguém condena o cristianismo com base nos programas de televisão neopentecostais. E, inversamente, não demonstramos respeito genuíno pelo islã quando o tratamos como uma religião inerentemente pacífica e democrática, assim como não nos sentimos respeitados quando militantes socialistas tentam cooptar nossa fé para a causa deles, ou quando Ali tenta transformar Lutero em um revolucionário iluminista.

4.2. Não à politização

No caso específico do islã, convém resistir com todas as forças à tentação de uma abordagem apenas (ou primariamente) política. Um sintoma claro de que caímos nesse erro ocorre quando tomamos (qualquer) partido no debate estéril sobre a compatibilidade ou não do islã com os “valores ocidentais”. Só podemos afirmar ou negar essa compatibilidade se desconsiderarmos a tremenda diversidade (para não dizer confusão) presente em ambos os lados. Nesse caso, cometemos o duplo erro de preencher a palavra “islã” com uma concepção qualquer — adorável ou terrível, mas sempre simplista — e atribuir à expressão “valores ocidentais” as categorias, não do Ocidente que existe, mas do projeto de Ocidente que é da nossa preferência. No caso de Ali, esse projeto é o do liberalismo político. Mas também poderia ser o do conservadorismo, que tende a negar a compatibilidade e julgar os que pensam de outro modo como ingênuos ou hipócritas. Ou então o da social-democracia, que tende a afirmá-la e julgar os antagonistas como arrogantes ou preconceituosos. Em qualquer caso, deixamos que nosso modo de encarar o desafio islâmico seja moldado por um projeto político que é necessariamente centrado no Ocidente e totalmente indiferente ao islã em suas motivações mais básicas.
 
Embora seja importante defender e fazer progredir a influência dos valores cristãos na civilização ocidental, a pátria última do cristão não está no Ocidente, e muito menos no Ocidente secularizado, no qual a fé na esfera pública é vista como ameaça e somos deixados com um falso dilema entre o progressismo iluminista e o relativismo cultural. A crença na coesão do Ocidente tem caráter ideológico, não descritivo; e, ironicamente, esse é um ponto que os secularistas têm em comum com os muçulmanos.
   
O cristão deve evitar esses simplismos ideologicamente motivados. Mesmo nos pontos em que concordamos com alguma vertente ocidental (ou islâmica), os acordos são sempre parciais e superficiais. Nossa lealdade última, porém, não é a nenhum deles. O fato de um dos lados de um conflito estar errado não significa que o outro lado esteja certo, nem que mereça ter seus erros minimizados segundo a conveniência política do momento. Nossa familiaridade maior com um dado estado de coisas nos inclinará a uma visão assimétrica do pecado nas diferentes culturas, mas devemos resistir a essa parcialidade como a uma autêntica tentação intelectual. Veja-se o caso do tratamento dispensado às mulheres, que é totalmente diferente no Ocidente e no mundo islâmico, embora perverso e pecaminoso em ambos. Quando criticarmos a postura islâmica em relação a elas, não devemos nos comportar (nem mesmo por omissão) como se a situação da mulher ocidental, preferível em vários aspectos importantes, fosse eminentemente bíblica e agradável a Deus.

4.3. Não ao coletivismo

Uma consequência particularmente triste da adoção dos critérios secularistas, em especial a primazia indevida da política e o foco em elementos históricos e sociológicos, é a hegemonia da estatística, isto é, de uma abordagem puramente quantitativa. Naturalmente, não pretendo negar que esse tipo de abordagem tenha um papel importante. Saber, por exemplo, que 75% dos muçulmanos paquistaneses e 41% dos iraquianos são favoráveis à pena de morte para apóstatas (p. 28)16 é relevante do ponto de vista político e acadêmico. Mas não ajuda em nada a entender a cosmovisão dos outros 25% e 59% que não pensam assim; e, na verdade, também ajuda muito pouco a entender os que assim pensam. Não sendo o cristianismo uma cosmovisão coletivista, devemos sempre estar dispostos a equilibrar nossas avaliações gerais com um interesse igualmente genuíno pela compreensão do muçulmano individual que a qualquer momento pode cruzar nosso caminho, na irredutibilidade de sua pessoa.17
   
Sem essa disposição, o indivíduo muçulmano jamais poderá deixar de ser parte de um coletivo distante para se tornar alvo do nosso amor. Ali possui um coração compassivo e muita disposição para lutar pelo que entende (muitas vezes com razão) ser o bem estar dos muçulmanos — em especial das muçulmanas. Contudo, ela aparentemente considera os radicais como casos perdidos: em suas próprias palavras, “Eles não são o público visado por este livro. São a razão de ele ter sido escrito” (p. 24). O cristão não tem o direito de ignorar a individualidade nem mesmo desses, e tampouco de deixar de estender a eles o amor com que Cristo ordenou que amássemos nossos inimigos.
   
Para muitos cristãos, em especial os politicamente engajados, essa ideia pode ser de difícil aceitação. Os cristãos à esquerda tenderão a dissolver o amor cristão em uma mera tolerância cordial e politicamente correta. Os cristãos à direita tenderão, como Ali, a dar mais importância ao combate ao inimigo, considerando simples ingenuidade a suposição de que haja algo mais a ser feito nesses casos. Invoco contra ambos os equívocos o exemplo bem conhecido do Irmão André, que pode ser criticado em várias coisas, mas não pode ser acusado de desconhecer a realidade dos cristãos perseguidos em países islâmicos, nem de falta de contato amoroso com muçulmanos de todos os tipos, inclusive terroristas.18
   
Mesmo no plano puramente intelectual e acadêmico, essa disposição caracteristicamente cristã já tem demonstrado um potencial de sensibilidade, compreensão e ação muito superior a qualquer coisa que o secularismo tenha a oferecer.19 Um bom exemplo a ser citado nesse sentido é a alemã Christine Schirrmacher, diretora do Instituto Internacional de Estudos Islâmicos da Aliança Evangélica Mundial e consultora do governo alemão e de outros países. Ela tem escrito extensamente sobre o tema, demonstrando sempre elevado conhecimento do islã, tanto no presente quanto no passado, e do aspecto especificamente religioso assim como do político e cultural. Essa autora tem buscado alertar a Europa para a futilidade de lidar com o problema do islã sem um esforço honesto e consistente de entendê-lo melhor num plano mais profundo.20

5. Considerações finais

Estou convencido de que uma cosmovisão cristã radicalmente moldada pelas Escrituras proporciona um ponto de partida muito mais eficaz para a compreensão do problema islâmico que qualquer coisa que possa ser oferecida pelo secularismo — seja na sua versão iluminista clássica, defendida por Ali, seja na versão relativista e multiculturalista que ela odeia e combate com justo vigor. Ao empreender essa tarefa, é muito importante que nos cerquemos de uma diversidade de perspectivas tão grande quanto possível, absorvendo de modo honesto e profundo as contribuições positivas que cada lado tem a oferecer — sem, no entanto, abrir mão da orientação e autoridade bíblicas, necessárias para a compreensão genuína de todas as coisas.

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1Infiel: a história de uma mulher que desafiou o islã. São Paulo: Companhia das Letras, 2007, 496 p.
2Nômade: do islã para a América. São Paulo: Companhia das Letras, 2011, 388 p.
3Herege: por que o islã precisa de uma reforma imediata. São Paulo: Companhia das Letras, 2015, 270 p.
4CAMPANINI, Massimo. Introdução à filosofia islâmica. São Paulo: Estação Liberdade, 2010, 37-38. O potencial genuinamente filosófico da obra al-Ghazali pode ser vislumbrado também no fato de que sua prova cosmológica da existência de Deus foi ressuscitada e atualizada por William Lane Craig, dando origem ao agora famoso argumento kalam. Cf. o capítulo 4 de CRAIG, William Lane. Em guarda: defenda a fé cristã com razão e precisão (São Paulo: Vida Nova, 2011).
5Historia de la filosofía islámica. Madri: Trotta, 1994.
6Infiel, p. 384-5.
7O tradutor da edição brasileira, certamente não familiarizado com a expressão intelligent design, traduziu-a erroneamente como “concepção inteligente”. Tomei a liberdade de corrigir o texto nesse ponto.
8Nômade, p. 23-24.
9Apud FERREIRA, Franklin.
A igreja cristã na história: das origens aos dias atuais. São José dos Campos: Vida Nova, 2013, p. 161-2.
10Para uma exposição dessas diferenças, cf. DOOYEWEERD, Herman, Raízes da cultura ocidental: as opções pagã, secular e cristã (São Paulo: Cultura Cristã, 2015).
11Estou de acordo com o filósofo inglês Roger Scruton, que, comentando a famosa tese de Samuel Huntington (1927-2008) sobre o choque de civilizações, afirmou: “Seria correto falar em choque de civilizações se o islã ainda tivesse uma” (entrevista concedida a The Clarion Review em 9 2009, disponível em http://www.clarionreview.org/2009/10/interview-roger-scruton/; acesso em 8 de novembro de 2015). Apesar do tom jocoso, que provavelmente levará muitos leitores a tomar essa declaração como mero insulto, considero-a pertinente e precisa por reconhecer dois fatos importantes: a capacidade historicamente demonstrada do islã de formar uma grande civilização e sua incapacidade de mantê-la em existência, de modo que a mentalidade islâmica típica de hoje é apenas um resto degradado do que já foi.
12Um autor brasileiro que padece do mesmo problema é Demétrio Magnoli. Cf. seu O grande jogo: política, cultura e ideias em tempos de barbárie (Rio de Janeiro: Ediouro, 2006), p. 63-80. Cf. minha crítica de sua perspectiva em “O pacificador de torcidas” (disponível em http://andrelv.blogspot.com.br/2010/07/o-pacificador-de-torcidas.html). Magnoli é um liberal mais à esquerda que Ali e mais próximo do pensamento politicamente correto, mas é igualmente veemente em sua defesa do estado de direito e está mais próximo do iluminismo clássico que a maior parte da esquerda brasileira.
13“Islã na Europa”, in ASH, Timothy Garton, Os fatos são subversivos: escritos políticos de uma década sem nome (São Paulo: Companhia das Letras, 2011), p. 189. Esse texto foi publicado originalmente em 2006. Em nota posterior, incluída no livro, Ash lamentou o uso da expressão, que, segundo ele, “dá margem à interpretação de que existe alguma simetria com o ‘fundamentalismo islâmico’” (ibid., p. 193). Considero, porém, a expressão apropriada, não só pela óbvia força retórica e irônica, mas também justamente porque alguma simetria evidentemente existe entre os dois casos. Convém ressaltar que não houve, da parte de Ash, nenhuma intenção de insulto; na verdade, ele e Ali eram e continuaram sendo amigos pessoais capazes de discordar veementemente.
14Uma boa introdução a essas questões de uma perspectiva cristã pode ser encontrada em SCHIRRMACHER, Christine, The Islamic View of Major Christian Teachings: the Role of Jesus Christ, Sin, Faith, and Forgiveness — Essays (Bonn: Verlag für Kultur und Wissenschaft, 2008).
15Muito do esforço recente da esquerda acadêmica de resgatar o que o islã histórico tem de melhor, motivado por aquele já mencionado pensamento politicamente correto que Ali despreza, é feito à custa de um rebaixamento do cristianismo, que continua vítima dos preconceitos de sempre. Exemplos dessa postura, embora competentes em vários outros aspectos, podem ser encontrados em LEWIS, David Levering, O islã e a formação da Europa: de 570 a 1215 (Barueri: Amarilys, 2010) e LYONS, Jonathan, A Casa da Sabedoria: como a valorização do conhecimento pelos árabes transformou a civilização ocidental (Rio de Janeiro: Zahar, 2011).
16Essa página contém uma porção de estatísticas desse tipo.
17Para um exemplo concreto e muito interessante de uma mulher muculmana que foge a muitos estereótipos, cf. WILSON, G. Willow, A leitora do Alcorão: como uma jovem americana se converteu ao Islã e encontrou o amor (Rio de Janeiro: Rocco, 2011). Cf. também O evangelho para muçulmanos: um incentivo para compartilhar as boas novas de Cristo com confiança (São José dos Campos: Fiel, 2015), do ex-muçulmano Thabiti Anyabwile, que oferece uma abordagem bíblica e bastante piedosa focada na relação pessoal com muçulmanos.
18Ver seu testemunho em seu livro escrito em coautoria com Al Janssen: Cristãos secretos: o que acontece quando muçulmanos se convertem a Cristo (São Paulo: Vida, 2008), esp. p. 239-275.
19Embora não seja possível discuti-lo em profundidade aqui, não desejo ignorar o caso interessantíssimo da contribuição dos pensadores de forte influência cristã, mas comprometidos com valores secularistas. É o caso das tradições teológicas liberais europeias, por exemplo, das quais o já citado Henry Corbin é um fruto ilustre, como grande islamólogo que foi. Por conta de sua considerável influência cristã, esses intelectuais costumam alcançar uma compreensão do islã muito mais profunda que a de autores como Ali. Apesar disso, a ausência de um compromisso biblicamente orientado deixa espaço para muitas avaliações equivocadas. Um exemplo mais recente dessa tendência pode ser visto no excelente Bíblia e Alcorão: o que os une — o que os separa (São Paulo: Loyola, 2006), do teólogo católico alemão Joachim Gnilka.
20Vários de seus livros foram publicados na série The World Evangelical Alliance Global Issues Series (Bonn: Verlag für Kultur und Wissenschaft): o já citado The Islamic View of Major Christian Teachings (2008), que contém um sumário comparativo da teologia islâmica mainstream; .Islam and Society: Sharia Law, Jihad, Women in Islam — essays (2008), sobre uma variedade de temas éticos e sociais; Islam: an Introduction (2011), com um resumo bastante abrangente; e The Sharia: Law and Order is Islam (2013), um estudo específico sobre os sistemas jurídicos islâmicos. Cf. ainda SCHIRRMACHER, Thomas, The Koran and the Bible (2013), que disseca as diferenças entre cristãos e muçulmanos quanto à relação com Deus e com seus respectivos livros sagrados. Thomas é marido de Christine e missiólogo, antropólogo cultural e sociólogo das religiões.

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