A chegada imprevista de Paulo em Atenas

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Introdução

A chegada do apóstolo Paulo em Atenas não foi uma trajetória projetada em seu planejamento missionário, como no caso da sua primeira visita à Roma no início do ano 60 e meados do ano 62 d.C., apesar da referida viagem à Roma não ter sido executada como ele planejava — ir livremente, pois Paulo chegou ao destino desejado como prisioneiro.1 Lucas não informa acerca do possível desejo de Paulo de visitar Atenas e nem mesmo nas fontes paulinas se encontra o manifesto desta visita imprevista. Todavia, é possível perceber o desejo missionário que ultrapassa o formalismo acadêmico na sociedade estruturalista, a qual defende que sem planos traçados nada dá certo.  O planejamento é importante na obra de Deus, mas não é indispensável para a proclamação do evangelho, porquanto quando Deus intervém nos planos do seu servo, este é obrigado a mudar a sua agenda para seguir a agenda divina, e foi o que aconteceu com Paulo nesse contexto. No desenvolver deste ensaio, serão abordados: (1) o contexto da segunda viagem missionária de Paulo, (2) o perfil da cidade de Atenas, e (3) por fim, veremos como Deus comandou a jornada missionária de Paulo, uma chegada imprevista na capital intelectual do mundo da antiga Grécia.

1. O contexto da segunda viagem missionária de Paulo: o evangelho é anunciado em meio às turbulências

A presença do apóstolo Paulo no território dos atenienses se enquadra em sua segunda viagem missionária. A jornada foi iniciada com um grande momento de desavença: separação dele com o seu companheiro de missão, Barnabé. Após o primeiro Concílio da igreja primitiva realizado em Jerusalém, registrado em At 15 – produto do término da primeira viagem missionária que se iniciou em Antioquia da Síria (At 13) – Lucas nos informa que, passado alguns dias, depois da discussão e acertos acerca do que foi aprovado neste Concílio, Paulo sugeriu a Barnabé que fossem visitar os irmãos em todas as regiões que eles tinham anunciado o evangelho, com a finalidade de saber sobre o andamento da obra e dar-lhes assistência doutrinária. Acontece que Barnabé se dispõe a prosseguir, mas queria que o seu primo-sobrinho, João Marcos (autor do Evangelho Marcos, convertido por Pedro, este se tornou amanuense dele) fosse com eles, uma posição contestada por Paulo.

Na primeira viagem missionária, o ajudante João Marcos não completou a jornada e teve que voltar para Jerusalém antes do fim da missão (At 13.13). Isso aconteceu quando eles foram até ao interior da Antioquia da Pisídia,2 em Perge na Panfilia (At 13.13). Paulo julgou ser desnecessário levar o jovem Marcos de novo ao campo, uma vez que ele já havia desistido (At 15.36-40).

Ao registrar o clima culminante entre Barnabé e Paulo, Lucas deixou claro em Atos 15.39-49: “E a divergência entre eles foi tão grave que se separaram um do outro. E Barnabé, levou Marcos consigo navegando para Chipre. Mas Paulo, tendo escolhido Silas, partiu confiado pelos irmãos à graça do Senhor. Passou pela Síria e Cilicia, fortalecendo as igrejas” (At 15.39-41, AS21).3 Esta cena marcou um momento decisivo e conhecido como a segunda viagem missionária do apóstolo Paulo. É provável que o apóstolo assumisse a liderança da equipe,4 em preparo antes de prosseguir sua viagem. No entanto, ao chegar a Derbe e Listra, Paulo encontra ali um discípulo, o jovem Timóteo – natural de Listra, substituindo assim, Marcos. Lopes sugere que os familiares de Timóteo – a mãe Eunice e a avó Lóide – se converteram a Cristo na primeira viagem missionária de Paulo.

Quando Paulo terminou de visitar as igrejas que foram fundadas na primeira viagem missionária, provavelmente no sul da província romana da Galácia, cuja única Carta escrita, aos Gálatas – destinada para as quatro igrejas que se situaram no sul desta província:  Derbe, Listra, Icônio e Antioquia da Psidia.  Paulo e sua equipe (sem Barnabé e Marcos) atravessaram a região frígio-gálata, mas foram impedidos pelo Espírito Santo de anunciar as boas novas na Ásia Menor (província romana da Ásia – na atual Turquia). Tentaram ir para Bitínia, mas foram impedidos de novo pelo Espírito de Jesus, resolvendo assim, partir para Trôade, onde Paulo teve uma visão de um varão da Macedônia suplicando que ele fosse lá para ajudá-los (At 16.6-9). Eles foram de imediato, conscientes de que Deus os havia chamado para anunciar o evangelho nesta província romana (At 16.10).5

Filipos foi a primeira cidade do continente europeu conquistada pelo evangelho. A empresária Lídia foi a primeira pessoa convertida nessa missão pioneira no Ocidente. Quando uma jovem escrava foi liberta pelo poder do evangelho, Paulo e Silas foram espancados e presos. Libertos desta prisão por intervenção soberana de Deus, o carcereiro ficou furioso com a cena ao ponto de querer suicidar-se, devido a severa pena que seria aplicada pela jurisdição romana ali, mas ainda assim, Paulo e Silas lhe anunciaram o evangelho, levando o carcereiro e toda sua casa à conversão.

Após o ocorrido, Paulo e Silas partiram para Tessalônica. Nesta cidade, Paulo pregou o evangelho nas sinagogas e alguns judeus se converteram bem como boa parte dos gregos tementes a Deus (At 17.1-4). Porém, os judeus que não se convertiam em Tessalônica ficaram com inveja ao verem muitas pessoas sendo convertidas ao evangelho inclusive as que faziam parte do judaísmo. Paulo e Silas foram enviados de Tessalônica para Beréia, porque os judeus de Tessâlonica tentavam pressioná-lo.

É curioso saber que quando Paulo chegou à cidade de Beréia, de novo, anunciou o evangelho aos bereianos. Segundo Lucas, estes tinham a mente mais aberta e conferiram em sua Bíblia grega-LXX (a tradução do hebraico para o grego) o que estava sendo exposto por Paulo acerca da pessoa do Messias no Antigo Testamento. Entretanto, havia um número considerável dos bereianos que se convertiam através da pregação de Paulo. Para Darby (1987, p.65): “Aqui [em Beréia] os judeus são mais nobres: Examinam as Escrituras para verem se era mesmo assim o que se lhes anunciava. Foi por isso que ali um tão grande número creu na mensagem e em Jesus”.

Quando Paulo deixou a cidade de Tessalônica, devido às intensas perseguições provocadas por judeus da cidade, ele foi para Beréia junto com seus companheiros de equipe. Mesmo sendo bem recebido nessa cidade, onde podia expor livremente o evangelho na sinagoga bereiana, pesou, porém, muito sobre ele a preocupação dos novos convertidos em Tessalônica, por motivos das perseguições dos judeus tessalonicenses contra os seguidores de Cristo.

A preocupação de Paulo é notável, pois os judeus de Tessalônica, quando souberam que Paulo estava pregando o evangelho em Beréia,6 foram até lá incitar as multidões contra ele. Os irmãos enviaram Paulo pela região litorânea, enquanto Silas e Timóteo ficaram ali. Nesta última cidade, antes de Paulo chegar a Atenas, o alvo da perseguição não era mais a todos os integrantes da equipe – Paulo, Timóteo, Silas e Lucas, mas apenas ao líder, Paulo. Pode-se notar uma intensificação da perseguição contra ele, por parte dos seus conterrâneos, particularmente os da fala grega, os judeus helenistas. Já que Paulo, considerado o fundador do cristianismo – segundo Mercia Eliade, era quem dirigia esta equipe, os judeus queriam eliminá-lo. A natureza desta tendência está explícita quando Lucas disse que “os irmãos enviaram Paulo para a região litorânea; mas Silas e Timóteo ficaram ali” (At 17.14, AS21). Ou seja, os cristãos bereianos pouparam a vida de Paulo.

Pelo fato de Silas e Timóteo não terem sido enviados juntos com seu líder, Paulo, certamente eles ficaram isentos da perseguição nesta cidade. Darby (1978, p.65) sustenta que quando os judeus de Tessalônica invejosos com o progresso do evangelho dirigiam até Beréia, “e os irmãos apressam-se a fazer sair Paulo da cidade, onde, no entanto, Silas e Timóteo continuam,  visto ser Paulo o principal objeto da perseguição dos judeus”.

Portanto foi assim que Paulo chegou a Atenas. Lucas confirma isso na sua narração, dizendo: “E os que acompanhavam Paulo, levaram-no até Atenas. De lá partiram com instruções para que Silas e Timóteo fossem se encontrar com ele o mais depressa possível” (At 17.15, AS21).8

Segundo Pollock, Paulo ainda em Beréia já ansiava voltar a Tessalônica no intenso clima da turba para poder visitar aos recém-convertidos, a fim de lhes dar ânimo e fortalecimento. Mas, foi impedido duas vezes, por Satanás. Disse Pollock (1989, 144):

Paulo, que ansiava voltar a Tessalônica, esperava no pequeno porto abaixo de Olímpio enquanto um mensageiro [companheiro de equipe] foi à cidade [Tessalônica] para ver se sua chegada seria segura. O mensageiro voltou com más notícias. Como Paulo escreveu algumas semanas mais tarde.

O próprio Paulo informou isso aos tessalonicenses: “Por isso queríamos visitar-vos. Eu, Paulo, quis visitar-vos não somente uma vez, mas duas, contudo, Satanás nos impediu” (1Ts 2.18, AS21). Tratando desta questão, O´Connor apresenta a sua versão oposta a de Pollock em relação ao lugar onde Paulo se encontrava e desejava visitar os novos convertidos tessalonicenses, mas foi impedido duas vezes por Satanás. Segundo Murphy-O´Connor (2013, p.97-98):

Chegando a Atenas, a preocupação de Paulo era com os que haviam ficado em Tessalônica. Não tinha motivos para pensar que seus convertidos escapassem à perseguição de que ele conseguira fugir […] Nada surpreende se desesperasse na ânsia de saber o que teria acontecido. Mais uma vez tentara voltar a Tessalônica, mas fora impossível.

Ora, independentemente da discussão acerca do local certo (Beréia ou Atenas) onde Paulo se encontrava, ele expressou sua preocupação com relação aos novos convertidos da cidade de Tessalônica por meio de seu ministério. A verdade é que mesmo em meio às turbulências intensificadas contra ele por causa do evangelho, Paulo decide voltar a Tessalônica para poder dar ânimo a esses novos irmãos e fortalecê-los na fé — um risco de vida para ele, mas ele estava pronto a morrer.  Uma disposição também notória em Atenas.

O´Connor acredita que o apóstolo Paulo poderia ter reconhecido o engano de ter ido a Atenas. Visto que essa cidade já era velha e enferma, cercada pela glória do seu passado, a qual atraia mais seus admiradores do que seu próprio presente momento. Vejamos:

Em pouco tempo Paulo deve ter reconhecido o engano de ter ido para Atenas. Essa era uma cidade velha e doentia vivendo das memórias de seu glorioso passado. Por muitos séculos deixara de ser produtiva e criativa. Dela não tinha emergido grandes mentes, e as que tinham vindo de fora para lhe dar uma aparência de vida cultural eram medíocres. (Murphy-O´Connor, 2013, p. 98).

Essa suposição de Murphy-O´Connor não tem espaço na essência missionária de Paulo, uma vez que as viagens missionárias dele não foram definidas baseando-se somente na importância intelectual, cultural e na produtividade do então contexto de cada cidade. De fato, na época de Paulo, Atenas perdia sua glória, mas, mesmo assim, ainda era uma cidade de grande mente filosófica. Aliás, historicamente, Atenas era famosa pela mente brilhante e dos grandes pensadores, por outro lado, pobre nos aspectos econômicos, comerciais e industriais em comparação à sua vizinha, a cidade de Corinto, esta muito próspera, como bem descreve Murphy-O´Connor (2013, p.99):

Em Atenas, Paulo não deixaria de ouvir falar de Corinto, do outro lado do Golfo Sarônico. Bastava lembrar a infinitamente próspera cidade vizinha para deixar os atenienses loucos de inveja. No século IV a.C.,  os escritores atenienses expressaram sua raiva inventando palavras derivadas de “Corinto” para dizer diferentes aspectos do amor comercializado por exemplo: korintiázesthai, “fornicar”, korintiástes, um “proxeneta”, korínthiakóre, “prostituta”, e daí para baixo. No tempo de Paulo havia quem dissesse que em Atenas a lua era mais bonita que em Corinto.

Os atenienses julgavam-se ser mais justos e morais em relação aos seus vizinhos, os coríntios. Uma jactância longe de ser aceita pelo nosso olhar, referindo-me à visão cristã.  Qualquer povo sem Deus vive em imoralidade, cujas práticas de vida são chocantes aos olhos de Deus. Tanto os atenienses quanto os coríntios, todos são imorais e idólatras e nenhum deles se possuiu o grau de superioridade, no que diz a respeito, a essência do ser humano, tendo sua vida fora do caminho de Deus. Todavia, a cidade de Coríntio era muito rica, em compensação, a cidade de Atenas superava sua vizinha na esfera acadêmica e artística.

2. O perfil histórico de Atenas: uma cidade vestida pela beleza artística e intelectual

A paixão de Paulo para com as almas perdidas foi um marco importante em seu ministério nas regiões do Império Romano (Rm 15.19-20). Depois de visitar Filipos, Tessalônica e Beréia, Paulo agora pisa no solo de Atenas, “a capital intelectual do mundo, a cidade de Péricles, Sócrates, Platão e Aristóteles. O veterano apóstolo pisa na terra dos grandes corifeus da filosofia, dos homens que encheram bibliotecas com sua erudição”, disse Lopes (2009, p.67).

A Grécia tornou-se o berço da sabedoria da humanidade através de seus ilustres filósofos. Atenas foi a responsável pela civilização helênica, cultura que durou séculos e atravessou continentes. Ela estava entre as três cidades mais importantes do mundo greco-romano, ao lado de Alexandria e Tarso.

Atenas, o berço da democracia, orgulhava-se por ter ocupado o primeiro lugar entre as cidades-estados no início do século V a.C., por causa do papel de liderança que obteve na resistência pelas invasões persas. Na metade do século seguinte, Atenas controlava um império marítimo poderoso e rico. Seu domínio imperial terminou muito rápido, sendo derrotada por Esparta e seus aliados na guerra do Peloponeso (431-404 a.C.). Atenas não demorou muito para recuperar boa parte do seu domínio anterior.

No século IV a.C., de novo, Atenas lidera uma resistência contra a invasão da Macedônia, e mesmo depois da vitória de Felipe em Queroneia (338 a.C.), a cidade foi tratada com generosidade por ele de forma exclusiva e continua gozando de sua liberdade total e, inclusive, de seus setores administrativos. A liberdade é mantida, quando os romanos dominaram a Grécia em 146 a.C. Atenas vivia como um estado livre, aliado dentro do império.  Bruce descreve (2003, p.229): “As esculturas, a literatura e a oratória de Atenas nos séculos quinto e quarto a.C. nunca foram eliminadas; na filosofia, ela também ocupou o lugar de liderança […]”. Pode-se contemplar a forma como Atenas era poetizada com toda sua glória. Jonh  Milton citado por  Bruce (2003, p.229):

Atenas, olhos da Grécia, Mãe das Artes
E da eloquência, lar de famosa sabedoria
Ou hospedeira, em suas casas tranquilas,
Na cidade ou arredores, com suas alamedas sombreadas;
Veja ali o Bosque de Oliveira da Academia,
Lugar de repouso de Platão, onde o Pássaro Ático
Canta suas notas melodiosas por todo o verão,
Onde o monte florido Hermeto, com o som
Do murmúrio empreendedor das abelhas, convida
A tempos de reflexão; ali liso desliza
Sua correnteza que sustenta; atrás da parede veja
As escolas dos Sábios antigos; estes que criaram
O Grande Alexandre para conquistar o mundo,
O Liceu ali, a Porta acolá; […]
Á Filosofia dos sábios abra seus ouvidos,
Descida do céu sobre a casa de telhado plano
De Sócrates, veja ali sua Habitação,
A quem inspirou o Oráculo dito
Pelos mais sábios dos homens; de cuja boca fluíam
Correntes suaves que regaram todas as escolas
De Acadêmicos velhos e novos, com esses
Que se chamavam Peripatéticos, e a seita
Dos Epicureus, e os Estóicos rigorosos.

Segundo Kistemaker (2006, p.174): “Não sendo mais uma cidade próspera, Atenas havia perdido a influência política e comercial no mundo desse tempo. Os romanos haviam conquistado a cidade em 146 a.C., mas se abstiveram sabiamente, de interferir em seu governo local”. Atenas gozava, de certa forma, a independência. Repousam em sua boa reputação como centro das artes, literatura, filosofia, conhecimento e habilidade oratória. Tudo isso conquistado no período auge da Grécia, dos séculos V e IV antes da era cristã.

A tradição ateniense era muito radical em conservar o seu berço intelectual, por isso, novas ideias lançadas por estrangeiros eram vistas com grandes reservas. Na verdade, o pensamento de comparar e de igualar o texto sagrado com qualquer outro texto não bíblico, já era vigente antes da explosão da teologia liberal no Século XVIII. Boa parte dos atenienses via o evangelho anunciado por Paulo como uma nova ideia que estava sendo disseminada e deveria ser posta à prova pelos sábios da cidade como quaisquer novas ideias a serem difundidas ou as que já passaram ali. Pois Atenas:

Era uma cidade universitária toda ocupada em conservar sua herança intelectual; por isso via novas ideias com extrema reserva. As ideias propostas por estrangeiros deparavam ali com uma muralha de impregnada autossuficiência. A tradição dos saberes, em rígida hierarquia nesse relicário, era sua principal defesa contra a ameaça das novidades (Murphy-O´Connor, 2013, p.98).

Paulo certamente soubera do perfil histórico da Atenas, mas não foi essa razão que o levou a visitar a cidade, chegou ali de forma forçada e decidiu pôr em pratica sua maior tarefa já vista: proclamar o evangelho.

O apóstolo Paulo se dirigia a Atenas; e lá, dissertando na sinagoga, ficou muito impressionado à vista da idolatria geral dessa cidade indolente “[…] a disputa todos os dias na praça pública com os filósofos. Após essas acaloradas, Paulo anuncia o verdadeiro Deus perante os principais daquela capital intelectual do mundo de então, mandando dizer a Timóteo e Silas que fossem ter com ele”, disse  Darby (1978, 65).

3.  Deus comanda a trajetória missionária: Atenas não estava na agenda missionária de Paulo

A decisão de Paulo de ir a Atenas não está condicionada à importância ou não desta cidade. Pois, Paulo chegou a Atenas numa circunstância desumana, mas, diante de Deus, foi um destino apropriado para que o evangelho pudesse ser anunciado pela primeira vez a um povo tão idólatra, arrogante e soberbo em seus conhecimentos filosóficos. O povo ateniense precisava de fato de uma transformação urgente: o anúncio de uma novidade viva que confrontaria o seu suposto alto nível de conhecimento, como seus grandes pensadores já teriam zombado dos moradores de Corinto, até o ponto de lhes considerar imorais, prostitutos e infiéis aos seus cônjuges.

É importante notar que a chegada surpreendente de Paulo em Atenas, não pôde ser vista como um incidente na sua jornada missionária. Até poderia ser na visão humana, mas se fizermos uma breve retrospectiva sobre a gênese desta segunda viagem missionária, marcada com o rompimento dele com Barnabé em (At 15.36-41), entenderemos que Paulo sempre esteve sob as asas divinas. Sem ser determinista, pode sustentar que tudo o que acontece na trajetória do servo de Deus não é por acaso. Porém, há um governo de Deus sobre cada um de nós e sobre todos nós juntos, como já dizia Karl Barth9  “Deus não nos abandona a nenhum de nós e tampouco a nós todos juntos! – Há um governo!”.

Portanto, devemo-nos conscientizar que às vezes há muitas coisas que acontecem na vida do servo de Deus que nem ele mesmo sabe explicar. Visto que as lições da vida não nascem apenas nos momentos bons aos olhos humanos, elas também nascem nos momentos difíceis e às vezes fora do controle humano.

O que seria desgraça se torna vitória na visão celestial. Pois Deus sempre era, foi, está e estará ao lado do seu povo e o assistindo. Diante de Deus, nada acontece por acaso, mas tudo tem o seu propósito, como diz o autor de Eclesiastes: “Tudo tem uma ocasião certa e há um tempo certo para todo propósito debaixo do céu” (Ec 3.1).

Por isso, devemos entender a estada de Paulo em Atenas como uma orientação divina para execução da obra missionária. Porque a cidade era de fato, o maior centro da idolatria da época. Como já é do nosso conhecimento, no plano pessoal de Paulo ou de sua equipe missionária, a cidade de Atenas estava fora de sua agenda missionária. Uma lição a ser seguida para quem almeja ser o puro pregador do evangelho da graça. Deus é quem comanda ou dá ordem (fiat, em hebraico) sobre a trajetória total do seu enviado. Pois o sucesso do missionário, do pregador, ou qualquer serviço prestado ao Reino de Deus não deve ser medido pelos resultados estatísticos dos convertidos e das igrejas implantadas, mas sim, ser guiado por Deus e fazer exclusivamente o que ele ordena.

Palavras finais

A fama da cidade de Atenas, capital da antiga Grécia, perdurou de tempos remotos, desde o século V, antes da era cristã. Ninguém iria duvidar ou negar que Paulo não soubesse do perfil acadêmico desta cidade. É claro que sim, ele sabia. Dessa forma, podemos tirar lições marcantes em nossa vida cristã. Neste contexto especifico, quando se trata do Reino de Deus a ser anunciado às nações: Nossa visita turística deve ser acompanhada com visão celestial e saber que Deus é quem nos guia e nos cobre com suas asas santas.

Paulo antes da sua conversão, certamente nunca tinha visitado a Atenas, mesmo durante suas grandes jornadas missionárias, e no seu plano estratégico e missional, o maior solo filosófico da humanidade não estava na sua agenda.  Porém, como já lemos que o contexto que culminou com a visita inesperada dele em Atenas, as circunstâncias humilhantes humanamente falando, perseguições, opositores e rejeições foram transformadas por Deus como uma seara fértil para semear a semente que produz a vida eterna em Atenas: “alguns homens creram em Cristo” (At 17.34).
Paulo foi empurrado em meio às perseguições para que o evangelho fosse pregado pela primeira vez em Atenas. Segundo Boor (2003, p.249), agora Paulo se encontra em Atenas: “não foi seu plano pessoal que o conduziu até o centro daquele tempo. Foi o plano de Deus. Havia sido empurrado adiante, de cidade em cidade, de fato ‘empurrado’ pelas reiteradas oposições e perseguições que não lhe permitiam permanecer em nenhum lugar”.

Portanto, ao chegar ali, Paulo se sentiu indignado pela idolatria ateniense, e sem demora ele ataca esta má prática através da pregação do evangelho. A beleza da cidade ateniense vestida pelo brilho do seu ambiente intelectual e filosófico e do seu passado artístico e político, não contentou o apóstolo Paulo, visto que os moradores de Atenas eram ricos em intelectualidade, mas carente da graça e cega perante o verdadeiro Deus, o criador do cosmos – universo: Paulo os anunciou as boas novas da salvação.

Referências Bibliográficas

AZEVEDO, Israel Belo de. Pastoreados por Paulo: As mensagens de Romanos a Efésios Comentadas tema por tema. São Paulo: Hagnos, 2011. Vol.

Bíblia Sagrada Almeida Século 21. São Paulo: Vida Nova & Hagnos, 2008.

BRUCE, F. F. Paulo, o apóstolo da graça: a sua vida, cartas e teologia. São Paulo: Shedd Publicações; 2003.

BOOR, Werner de. Atos dos Apóstolos: Comentário Esperança. São Paulo: Esperança, 2003.
DARBY, J.N. Estudos a Palavra de Deus Actos dos Apóstolos Epistola aos Romanos 1ª epistola aos Coríntios. Lisboa, 1978.

KISTEMAKER, Simon. Comentário do Novo Testamento Atos volume 2.  São Paulo: Cultura Cristã; 2006.
LOPES, Hernandes Dias. Paulo o Maior Líder do Cristianismo. São Paulo: Hagnos, 2009

MURCHPY- O´CONNOR, Jerome. Paulo de Tarso: História de um Apóstolo. São Paulo: Loyola 2013.
POLLOCK, John. O Apóstolo. São Paulo: Vida, 1989.

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1Ver em At 19.21; Rm 1.11-13; e 15.22-24. Este contexto marca a terceira viagem missionária do apóstolo Paulo, que culminou com a sua quinta e última visita a Jerusalém, e preso em Cesareia durante dois anos, apelou para ser julgado em Roma, porém foi enviado como prisioneiro. Ao chegar a Roma, ficou em prisão domiciliar durante dois anos, após isto foi liberto. Paulo voltou a ser preso de novo sob a ordem do então imperador Nero, onde foi decapitado em 64 d. C. (At 20-28). Portanto, pelo contexto de Romanos 15.29, Paulo também estava ciente de que em todo caso, a chegada dele em Roma, seria na plenitude da benção de Deus “E bem sei, quando vos for visitar, chegarei  na plenitude da benção de Deus”, AS21). Lucas em seu segundo livro, Atos dos Apóstolos, mostra-nos que, de fato, Paulo chegou à cidade imperial no tempo fixado por Deus: na benção divina.
2Antioquia da Psidia, Derbe, Listra e Icônio eram quatro cidades que compõem a província da Galácia, nas quais Paulo fundou as igrejas em sua primeira viagem missionária, At 13 -14.  Tendo escrito a carta e endereçada aos Gálatas, que corresponde a estas quatro cidades.
3Bíblia Sagrada,  Almeida Século 21.
4Segundo Lopes (2008, p.38): “A iniciativa da segunda viagem missionária é de Paulo”.
5Pela primeira vez no livro de Atos dos Apóstolos, Lucas emprega o primeiro pronome plural “nós” e, a partir de então, sempre o utiliza, quando é necessário para se incluir como o integrante da equipe missionária. É importante ressaltar que Lucas não fazia parte dos integrantes da equipe da primeira viagem missionária de Paulo, esta foi composta pelos seguintes integrantes: Barnabé, Paulo e João Marco, o mesmo autor do Evangelho Marcos.  Já na segunda viagem, com novos integrantes da equipe, Lucas, Timóteo e o casal Áquila e Priscila, mais tarde o deixou em Éfeso (At 18.1-19).
6A igreja de Bereia não foi a única em que Paulo não destinou a carta. Na cidade de Atenas, acredita-se que, havia uma igreja ali, mesmo sem ter sido endereçada a carta. Paulo fundou a igreja em Laodicéia. Ele chegou a escrever a carta aos laodicenses, porém, essa carta se perdeu.
7Mais tarde, o seu filho na fé, Timóteo, foi junto a Paulo em Atenas. Dali, Paulo enviou-o para Tessalônica (1Ts 3.1-2).Segundo Azevedo (2011, p.9) Paulo chegou a Atenas no inicio do ano 52 d.C. (
8At 17.16-34). Foi o mesmo período referido por Paulo em sua primeira epístola aos tessalonicenses (1 Ts 2.17-18; 3.1). 9As últimas palavras do teólogo do Século XX, antes da sua partida aos Céus, Karl Barth. Ele faleceu em 10 de dezembro de 1986, aos 82 anos, em Basiléia.

2 COMENTÁRIOS

  1. Fico muito feliz em saber que a história e fato como a do apóstolo Paulo,ainda estão tão viva e eficaz na mente e coração ❤️ de todos os cristãos e filhos de Deus 🙌 🙏,e agradeço pela introdução e dinâmica,do texto lindo por mim isso só me veio agregar mais conhecimento pro meu mundo espiritual o rogado.

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